mas infalível espingarda de espantar pardais com o seu esplêndido atavio de experimentado caçador de caça grossa.

Uma voz que há acordo geral - admirável concordia - quanto à triste realidade da falta de caça e considerando que as práticas correntes abrem caminho para o chamado deserto cinegético, os caçadores podem preparar-se para limpar e arrumar as espingardas e, com elas, todos os problemas que ora nos afligem.

Entretanto, vão-se queixando dos coutos, e os couteiros dos caçadores e os ralhos crescendo dia a dia, serão tanto mais vivos quanto mais faltar a caça.

Nestas circunstâncias a mim me parece que não devemos esconder as mais duras verdades e que devemos tentar os remédios mais amargos.

Prouvera a Deus que ainda produzissem algum efeito.

Entro na coutada da caça pràticamente sem armas mas também sem preconceitos, apostado em procurar o melhor caminho e disposto a segui-lo, andando, suando e sofrendo para ir de encontro à caça e fixar a sua relação com a terra e os direitos do caçador.

A criação de caca e o repovoamento cinegético deve considerar-se hoje como um problema económico, e um problema económico sério. O valor da caça de algumas herdades do Alentejo já é superior a um quarto do seu rendimento total.

Ora estes problemas económicos trazem-me sempre à lembrança aquele eminentíssimo professor americano que abria o seu curso com esta pergunta muito pertinente "Que é que um economista deve economizar?" E respondia, respondia Srs. Deputados, ensinando aquilo de que andamos muito esquecidos um vários sectores económicos "O economista deve economizar apelos a actos desinteressados, àquilo que algumas religiões chamam caridade e, em linguagem corrente, fraternidade e amor."

O romantismo político, que é responsável pelos maiores estragos do século passado abriu os coutos e transformou a caça em dadiva pura da Natureza, dádiva que todo o homem recolhera livremente sem trabalhos e sem indústria.

Os o na Alemanha em 1848, fazendo parte dos direitos fundamentais do povo alemão a declaração de que "o direito de caçar estava contido na propriedade e os direitos gratuitos de caça em terra alheia ficavam suprimidos".

Julgo indispensável recordar estes factos históricos para não amarrar a mascara feudal ao conteúdo de um direito que é essencialmente popular.

A Revolução também tem algumas tradições respeitáveis nesta materia do direito de caçar.

A caça não deve ser do caçador, mas da terra.

O conteúdo do direito feudal que a Revolução afrontou era outro, consistindo no exclusivo da caça, incluindo o direito de caçar em terra alheia.

Ora, foi precisamente este direito de caçar em terra alheia, que o nosso legislador transferiu do rei e dos senhores para toda a gente.

Assim os actuais caçadores, agora com a burocracia venatória ao seu serviço, são os herdeiros dos senhores feudais e os lavradores continuam a ser as vítimas do sistema.

Vozes: - Muito bem!

venatória inerente aos coutos de caça.

Estava instituída a liberdade de caçar e estava aberto o caminho por onde se chegou à situação do extermínio que todos os projectos e pareceres que me foi dado conhecer exuberantemente documentam.

A discussão do regime jurídico da caça abre-se, portanto diante de um património cinegético empobrecido e de uma tradição de século e meio de relativa liberdade de caçar.

E digo relativa porque sempre escaparam algumas reservas logo impostas pela força das circunstâncias e transformadas em refúgio de caça por via do privilégio concedido aos seus proprietários.

Parece indiscutível que a liberdade de caçar só teve conteúdo em longínquas eras paleolíticas quando a caça era abundante.

A própria abundância de caça desmente o prazer de caçar que desde o começo das idades supõe uma certa escassez que a torna privilégio do caçador.

Quando a caça acabar poderão os caçadores forçar as suas liberdades, poderá a burocracia venatória proclamar os seus inúteis direitos, mas caçar, caçar a perdiz vermelha será o privilégio daqueles raros cidadãos a quem a fortuna permita chegar onde houver caça e pelo preço que ela custar, será, repetimos, um privilégio - e um privilégio de gente afortunada.

Os outros podem persistir em correr montes e vales, invadir campos e culturas munidos de licença de caça, mas hão-de regalar-se gozando o maravilhoso sol de Inverno ou divertir-se na Primavera com o balanceado cantar do cuco a marcar o tempo das suas desilusões.

É neste pendor da desgraça venatória que eu me rendo e me entrego mais uma vez à contemplação das boas re-