por uma mecânica complexiva e relativamente eficiente, acrescentarei hoje alguma coisa ao que disse sobre direito francês.

Segundo o doutor em direito Jacques Guilbard, juiz parisiense, no direito francês surpreendem-se várias modalidades de reservas com funções de melhoria e repovoamento.

Há reservas convencionais em que o detentor do direito de caça reserva uma parte das suas terras para que aquela se reproduza.

O accionista não pode caçar nessa reserva.

Em segundo lugar , há reservas aprovadas pelo Ministro da Agricultura, de harmonia com o decreto de 1961 sinalizadas e de um só proprietário.

Novas reservas foram criadas por uma lei de Maio de 1965 e reguladas por decreto, segundo propostas das federações departamentais, conselho municipal, conselho geral e câmaras de agricultura.

Há ainda parques nacionais de caça e pesca regulamentados e com guardas ajuramentados.

Há, por fim, as caças guardadas, em que muros, redes e sebes sem solução de continuidade oferecem obstáculo sério à entrada e passagem das pessoas.

Posso acrescentar, porque sei, que proliferam as sociedades de caça, constituídas por acções e quotas, algumas até com propriedades na posse ou administração dos bancos. Em regra, estas diferentes formas de resguardo permitem batidas e caça deambulante, proíbem a entrada a caçadores não convidados, mas admitem a captura de caça viva para repovoamento.

Quer dizer, para assegurar a conservação da fauna cinegética, a sua proliferação e abastecimento de animais vivos, a França ostenta um sistema de reservas que são obstáculo intransponível para todo e qualquer caçador.

Desde 1951 que nos departamentos a criação de reservas se tornou obrigatória. E a França é o solar da democracia verdadeiramente popular.

Alguns oradores - e dos mais vigorosos -, mas poucos, trouxeram aqui uma hostilidade crítica à existência de coutadas e, implicitamente, ao sistema de reservas.

Este sistema é universal.

Vozes: - apoiado!

O Orador: - E não podemos obliterar o que está instituído em Moçambique e Angola e que funciona entre nós há séculos. Eu esperava que se discutisse sobretudo o aspecto fundamental das reservas e coutos e que, em vez de melhores interpretações do sentimento público e dos desejos incontidos dos caçadores, se visse - mesmo acima do problema nacional da riqueza cinegética e do povoamento -, o aspecto jurídico fundamental do mesmo problema.

O que eu gostaria de ver discutida era a ideia de que a coutada e a reserva são concessões do estado.

É esse o pensamento da corporativa e a ideia dominante nalguns professores italianos muito distintos.

Mas porquê?

Mas como?

E até onde?

Sem querer agir contra, quero focar alguns aspectos que me parecem relevantes.

Podemos equiparar a concessão jurídica da caça à concessão de iluminação eléctrica local ou à concessão de uma carreira de camionagem entre duas vilas de um distrito?

O Estado concede um Dom da Natureza, concede o que lá está à espera de apreensor?

Se a coisa não tem dono, o Estado concede o que não está na sua alçada e não é dele e nem tão-pouco dessa coisa que apropriou?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E se fosse propriedade ou objecto de posse, como é que o Estado invade a estera de aplicação dentro dos limites!

E para que limitações ou aplicações, se o Estado pode conferir ou negar, suspender ou revogar?

E, se é concessão por dinheiro, poderá o estado, por dinheiro, por favores, invadir o território alheio e dispor do que não é seu?

E isto é de uma tal enormidade!

Os santuários, as vedações, reservas, restrições de evasão venatória, são de todas as idades e lugares, tanto faz que o Estado seja a velha monarquia, o regime de liberdade e democracia e o socialismo prático. Têm uma tradição contra a destruição e o extermínio.

Vozes: - Apoiado!

O Orador: - Ditam-nos as necessidades de hoje: o ensino dos mestres de zoologia, as técnicas actuais de destruição, dita-os a civilização - mas a civilização que conserva e melhora, não a civilização que destrói e extermina.

Portanto, a concessão não é de direito privado, mas de direito público e atrás dela está não só a autoridade do Estado, mas uma larga tradição nos regimes populares mesmo.

Que é que nos ensina a Toscana, segundo o Dr. Cigolini?

Que é que nos ensina o Alentejo? Que onde há abundância de reservas não faltam animais de pelo e pena nos terrenos livres.

Portanto o repovoamento geral não é da competência dos donos dos coutos, mas da lei e, indirectamente, a riqueza geral cinegética também tem além a sua fonte.

Eles são indispensáveis à existência de uma cinegética.

O Sr. Calapez Garcia: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Calapez Garcia: V. Exa. focou no seu discurso o aspecto do Alentejo e, a esse propósito, quero concretizar o que acontece no Alentejo. É que muitas dessas concessões que foram dadas pelo estado foram erradamente dadas, porque visavam praticamente a reconversão cultural quanto à florestação. Portanto esses coutos funcionam como meros refúgios de caça. A caça que lá existe - e existe principalmente no fim de Novembro e durante o mês de Dezembro - não é caça criada nos coutos. É caça que se acolheu aos coutos depois de várias caçadas. Era para este aspecto do problema que eu queria chamar a atenção de V. Exa..

O Orador: - V. Exa. invoca uma situação de facto anterior à lei. Além disso, levanta aqui um problema de fraude que está muito longe das minhas considerações. Isso é fraude à lei - pelo menos é assim que os juristas lhe chamam. V. Exa. levanta portanto um problema de fraude que é uma questão de fiscalização ou eficiência de serviços. No entanto, acho melhor não continuar a discussão, porque suponho que nas minhas emendas, dou remédio para limitar o funcionamento de coutadas, sobretudo para que daqui por diante a coisa se passe de outra maneira.