Ainda em 12 de Fevereiro ultimo, no anunciai oficialmente a celebração do centenário de S. Pedro, Paulo VI insiste.

O mundo moderno, lançado em maravilhosas conquistas no domínio das realidades, visíveis, orgulhoso da consciência que cada vez mais toma de si mesmo, é levado ao esquecimento e à negação de Deus, sofre de desequilíbrios que a decadência religiosa arrasta consigo, no pensamento na vida moral e na ordem social, e resigna-se a ver o homem agitado por túrbidas paixões e angustias sem remédio.

Onde falta Deus, falta também a razão suprema das coisas a luz das, certezas primeiras, o imperativo moral indiscutível, das quais a ordem social tem necessidade.

Necessidade, sim, pois a alma do homem não se sacia com barras de ouro, e mesmo o animal humano não se contenta com a bolota. Como frisou o recente Vaticano II, na constituição A Igreja e o Mundo Moderno só o «Espírito de Deus, que dirige o curso dos tempos», poderá opor-se eficazmente a tais desequilíbrios e contradições «entre as raças, e os diversos grupos sociais, entre as nações ricas, as menos prósperas e as pobres, finalmente, entre as instituições internacionais nascidas dos desejos de paz que os povos têm e a ambição de propagar a própria ideologia ou os egoísmos colectivos».

Desgraçado mundo, na verdade Sr. Presidente, o que atribui mais valor às ideologias dos homens que aos próprios homens!

Vozes: -Muito bem!

O Orador: -Sr. Presidente: Ao evocar o 19.º centenário da morte de S. Pedro, faz Paulo VI um [...] apelo a fidelidade. Fidelidade à mensagem que ele veio anunciar em Roma ao mundo inteiro. E previne passos criados, mesmo entre cristãos. Adverte.

Insinuam-se aqui e além opiniões exegéticas e teológicas novas muitas vezes teológicas tiradas de audazes, mas cegas filosóficas protarias, pondo em dúvida ou deformando o sentido objectivo das verdades que a Igreja ensina, em virtude da sua autoridade. Sob pretexto de adaptar o pensamento religioso à mentalidade moderna, prescinde-se da direcção do magistério eclesiástico dá-se à especulação teológica uma orientação radicalmente historicista chega-se a despojar o testemunho da Sagrada Escritura do seu caracter histórico e sagrado e tenta-se introduzir no Povo de Deus uma mentalidade que se diz «pós-conciliar» e que não tem em conta a firme coerência dos amplos desenvolvimentos doutrinais e legislativos, da Igreja. Esta mentalidade levaria a trair o espírito de fidelidade que animou o Concílio.

Sr. Presidente: Hoje, todos os homens participam, directamente ou por reflexo, dos benefícios da humanização da vida resultante da mensagem que Pedro trouxe a Roma. E, até por gratidão, e não menos no seu próprio interesse para futuro, deve a humanidade manter fidelidade aquela mensagem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Sr. Presidente: Também nós, como ocidentais, como latinos, como europeus, como cristãos e como homens devemos admiração e reconhecimento ao primeiro papa. Como portugueses, então, devemos-lhe mais que muitos outros. Da catedral de Pedro e da Igreja de Roma «presidente da assembleia universal da caridade», como nas alvoradas do século II lhe chamou o citado Santo Inácio de Antioquia, [...], no decurso dos tempos, a mensagem cristã. E, sem reconquista cristã não se descobre como poderia ter sido chamada a existência histórica a nação portuguesa. E a sombra do Vaticano foi a mais eficaz protecção da jovem nacionalidade, quando árvore ainda frágil e exposta aos ciclones das ambições dos poderosos. Da mensagem cristã, muito mais que da geografia e da economia, recebemos o sentido da nossa existência colectiva, a nossa vocação histórica. Sem a mensagem cristã, Portugal, se existisse não teria em Alcobaça a mais bela nave do Mundo como a classifica Daniel Rops. Não teria a Batalha nem os Jerónimos, nem Santa Cruz de Coimbra nem Nossa Senhora da Oliveira, em Guimarães nem S Vicente de Fora nem as basílicas de Mafra e da Estrela nem o património cultural e artístico que aqueles centros de fé e cultura criaram ou representam e guardam os nossos museus. Nem Fátima seria hoje a tribuna donde Deus fala ao Mundo pela boca da Virgem, nem o cartão de identidade que nos dá a conhecer aos mais remotos povos do planeta. Quem falaria da nossa gesta marítima. Não existiram Os Lusíadas e nós não teríamos história.

São algumas razões para o povo português se não alhear do centenário da morte de S. Pedro a inaugurar em Junho de 1967 e a encerrar em Junho de 1968. Só acrescentarei outra. Por feliz comcidencia o centenário celebra-se no mesmo ano do cinquentenário das aparições de Fátima, para cujas comemorações de Maio na Cova de Iria Sua Santidade Paulo VI se dignou nomear seu legado a lacere um eminente purpurado da Cúria Romana o cardeal Costa Nunes, grande figura da Igreja e da Pátria encarnação viva do nosso antigo espírito missionalismo e símbolo autêntico do sentido da nossa história.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: -Fátima já pertence a história universal do nosso século. É algo de tão positivo que não pode ser destruído nem pelos ventos da história nem por qualquer rajada de palavras ou papéis portadora das que fustigam o Mundo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Haverá olhos tão estrabicos que enxerguem nos acontecimentos do Fátima um sintoma de provincianismo no quadro dos povos europeus? Não seria de estranhar, sabendo-se que num compêndio para jovens portugueses, um estrangeirado ensina que a admiração suscitada pela ascensão do padre Bartolomeu Lourenço Gusmão -a primeira tentativa do homem paia a conquista do ar - era um sintoma de atraso do nosso país!

Para os fiéis, conta apenas a posição ou a atitude do Sumo Pontífice. E, felizmente, ele paira muito acima de quaisquer pruridos [...] com ares de universalismo. De qualquer modo, Fátima não deixa de ser um acontecimento histórico, de ressonância no nosso planeta e de relevância universal. Foi da Sua terra, Terra de santa Maria que o Mundo ouviu a mensagem da Virgem, mensagem para todos os povos, profundamente espiritual e muito distante de economismos de qualquer natureza. Para o Mundo, falou através de crianças escolhidas entre os humildes, e não entre os grandes. O Mundo foi consagrado