Ë que o Estado, como cobrador das grandes receitas municipais, serviço que lhes presta com abundante remuneração, reservou-se o direito de retenção dessas receitas, se não houver voluntária solvência dos gastos com a saúde dos munícipes, gastos passados e presentes ... agora já liquidados com juros substanciais.

Poucas são as autarquias às quais este drástico sistema não causa profunda perturbação no desenvolvimento das suas múltiplas actividades.

Vozes: - Muito bem!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, as administrações que vivem em permanente estado de carência, vendo-se colocadas na impossibilidade de obedecerem à rigidez dos princípios dominadores da sua vida financeira, são forçadas a enveredar por caminhos de nítida oposição com os princípios para executarem os empreendimentos contidos nas comparticipações do Estado ou impostos pelas exigências dos seus administrados, que se não sabem acomodar às minguadas possibilidades das respectivas autarquias.

Ora todas estas e muitas outras situações de anomalia seriam desnecessárias se o ordenamento da vida administrativa deixasse de se basear nos artifícios legais que se institucionalizaram como dogmas indiscutíveis.

A luz baça dessa dogmática política se tem estruturado, todavia, toda a comparticipação das autarquias nos empreendimentos programados nos planos anteriores que mais interessam ao desenvolvimento local.

Havidas como dotadas dos meios necessários à comparticipação que lhes é atribuída, sem necessidade de lhes serem facultados quaisquer outros recursos além daqueles que lhes vêm do sistema actual, as autarquias ficam colocadas em situações pouco invejáveis.

Assim tem sucedido sempre, e, para não fugir à regra, também agora o mesmo se verifica no III Plano de Fomento.

Efectivamente, tendo sido projectados empreendimentos nos sectores da electrificação rural, dos abastecimentos de água, dos esgotos, da viação rural e outros melhoramentos, destinando-se-lhes 2 880 000 contos para o hexénio, programou-se o respectivo financiamento por forma a caberem ao Estado, das suas receitas e das do Fundo de Desemprego, 1290 000 contos, e às autarquias locais, 1 077 000 contos, devendo as concessionárias da distribuição de energia para a electrificação rural contribuir com 513 000 contos.

Se se tiver em conta que a comparticipação do Estado nesta gama de melhoramentos é de 50 por cento para as electrificações e esgotos, entre 60 e 85 por cento para as

obras de construção da viação rural e de 75 por cento para as de reparação de estradas e para as do abastecimento de águas, logo se fica a conhecer a extraordinária leveza com que foi considerada a posição das mesmas autarquias.

Este erro, aliás bastante grosseiro, merece, contudo, um pouco mais de atenção.

É que, a manter-se este escalonamento financeiro durante o cumprimento do Plano, se derrogarão os princípios que levaram o Estado à fixação de comparticipações diversificadas para acudir às autarquias de mais débeis recursos, o que seria uma chocante ofensa aos confessados fins de harmónico desenvolvimento do espaço português que o III Plano procura atingir.

Mas esse harmónico desenvolvimento só poderá conseguir-se se for feita uma conscienciosa distribuição dos meios de combate, no desequilíbrio de que se possa lançar mão.

Não pode perder-se de vista que há ainda vastas regiões do Portugal metropolitano que permanecem ensombradas por precário dese nvolvimento, pertinazmente professado no tempo pela incidência de múltiplos factores adversos.

São essas regiões servidas por órgãos administrativos empobrecidos que, no seu estado de carência, pouco podem fazer pelo desenvolvimento acelerado que é mister conseguir.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Terá então de lhes ser concedida uma ajuda substancial, adequada a criar-lhes potencialidades iguais ou muito semelhantes àquelas de que já desfrutam, ou venham a desfrutar, as regiões de aceitável teor de desenvolvimento.

O Sr. Nunes Barata: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não me furto, Sr. Presidente, a indicar, com base nos elementos que colhi nas publicações oficiais, uma ordem da grandeza deste impressionante desequilíbrio.

Assim, na receita global dos distritos do continente e ilhas adjacentes, que, fixada nos 808 200 contos em 1954, atingiu 1 755 000 coutos em 1965 - números redondos -, comparticiparam os distritos de Lisboa o Porto, respectivamente, com 416 000 contos em 1954 e com 929 000 contos em 1065, o que representa mais de metade daquelas receitas globais ...

Por seu lado, as duas Câmaras de Lisboa e Porto contribuíram para- estas receitas, respectivamente, com cerca de -286 100 contos e 77 800 contos naquele ano de 1954 que viram elevar-se no ano de 1965 a, respectivamente, 517 200 contos e a 146 200 contos.

Ora este acréscimo de riqueza não foi sentido em todo o território, pois os distritos da zona interior e as respectivas câmaras municipais e demais autarquias continuaram na escala das suas limitadas possibilidades, mau grado os esforços que desenvolveram para se libertarem das suas grandes limitações.

A vida difícil dessas autarquias das zonas do interior do território reflecte a vida dificultada dos seus próprios habitantes, que formam a maior parte dos 13 387 aglomerados de 100 ou mais almas oficialmente reconhecidos no território metropolitano, dos quais ainda 5192 não têm electricidade, 10 100 carecem do imprescindível melhoramento do abastecimento domiciliário de água e 2550 esperam o benefício do acesso por estrada, isto para apenas referir os três elementos fundamentais da vida civilizada.