novas estruturas oficiais, podem substituir-se, com vantagem, à livre iniciativa, eliminando a concorrência, concentrando coercivamente as empresas ou favorecendo situações de facto contrárias ao progresso do País e à real integração do espaço económico português.

Não terão bastado, como exemplo claro e definitivo, o inêxito das providências legislativas sobre reorganização industrial e a falência de outras iniciativas artificiosas, caras e nocivas, algumas das quais ainda em curso, mau grado as lições da experiência e os males que provocam?

Nesta ordem de considerações, não deixarei de aludir a outro problema de marcada actualidade e interesse: o das atribuições da organização corporativa.

No preâmbulo da proposta de lei relativa ao Estatuto Jurídico das Corporações, pude, no exercício de um mandato que, então, me estava confiado, chamar a atenção para o facto de o nosso corporativismo se opor não só às concepções do liberalismo, como a quaisquer doutrin as totalitárias, mesmo as de forma corporativa, e, designadamente, ao sistema comunista, atentatório da liberdade e dos valores espirituais.

E se, por um lado, afirmava que a criação das corporações reduzia o poder do Estado, como consequência lógica da ética em que assenta a estrutura política e social da Nação, por outro, lembrava que um dos escopos do regime corporativo é salvaguardar a livre iniciativa, na medida em que ela não fira as conveniências gerais. A concluir, faz a esta incisiva advertência:

Se o interesse colectivo não é coincidente com o conjunto dos interesses individuais - pensando-o, o individualismo cometeu o seu maior erro -, não é menos certo que o somatório dos interesses dos grupos profissionais ou das categorias económicas não é igual ao bem comum.

E acrescentava:

O sistema corporativo só se manterá fiel à sua própria autenticidade doutrinária se conseguir superar, na prática, esse perigo. De contrário, colocar-se-á em posição falsa, idêntica àquela em que, por definição, assenta o liberalismo. Este divinizou o indivíduo. Importa que aquele não divinize a corporação, transformando-a de meio, que é, em fim que não pode ser. Por outras palavras: para fugir ao totalitarismo do Estado não pode cair-se no estatismo da corporação.

Estes conceitos, sempre válidos e actuais, foram expendidos com firmeza e constituíram, mais do que um aviso, uma tomada consciente de posição.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A organização corporativa, se não deve vegetar ou fenecer à míngua de atribuições concretas e relevantes, também não pode ser comprometida com o exercício de poderes incompatíveis com a sua natureza e as suas finalidades específicas.

É incontestável que à organização não foram ainda entregues todas as atribuições que lhe cabem nos domínios .da disciplina das actividades, da representação aos agrupamentos que integram e da função consultiva. Para não falar noutros casos, há, por exemplo, alguns órgãos consultivos, como o Conselho Superior da Agricultura e o Conselho Nacional de Crédito, que bem poderiam desaparecer, passando as suas atribuições a ser desempenhadas pelos conselhos das corporações. Na própria Lei n.º 2086, de 22 de Agosto de 1956, se prescreve que «os órgãos consultivos dos Ministérios serão substituídos, sempre que possível, pelas corporações, às quais se agregarão, para o exercício de funções de consulta, representantes dos ser viços públicos ou de entidades especializadas».

Pois, não só não se deu cumprimento adequado a tal preceito, como se têm criado, apesar de vivas discordâncias de alguns sectores qualificados, outros órgãos consultivos bem dispensáveis, uma vez que as corporações poderiam desempenhar tais funções com eficiência e autenticidade.

Em contrapartida, desenha-se uma tendência para conferir a certos organismos corporativos atribuições que não se enquadram no elenco natural dos seus fins. E, se ao Estado não é lícito alienar poderes de todo indispensáveis à sua acção de supremo orientador e coordenador, também não é de consentir que os chamados corpos intermédios da sociedade invadam o plano das actividades reservadas à iniciativa privada.

A questão poderá não revestir, por ora, sintomas alarmantes, mas há-de acarretar, se não for enfrentada a tempo e com espírito de decisão, perturbações muito sérias. Os ensinamentos da história a este respeito são tão iniludíveis como a bondade dos princípios, a ordem natural da vida, o bem comum e os próprios interesses dos consumidores, que, até por não ser fácil enquadrá-los institucionalmente, o Estado deve defender com especial vigor.

Não é de permitir ou favorecer a entrega a organismos corporativos de atribuições próprias da iniciativa privada, que, precisamente, a eles cabe representar e defender, e não absorver e aniquilar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Admite-se que, a título excepcional e observadas condições especiais, alguns organismos pratiquem certos actos de comércio, como a aquisição e a venda de produtos, utensílios e alfaias destinados aos associados. Se, porém, a organização se converte em verdadeira empresa de comércio ou indústria, entra-se no pior dos caminhos para todos e ninguém sai beneficiado, a não ser, porventura, a burocracia encarregada da gestão dos negócios.

Vozes: - Muito bem!

o que, uma vez admitido o sistema, difícil é impedir, tanto mais que, desse modo, hão-de procurar salvá-lo os mais directos responsáveis pelo seu aparecimento, submetidos, ainda por cima