O Sr. Amaral Neto: - A propósito da Ponte da Arrábida, foram tomadas duas ou três deliberações infelizes na sua falta de consideração da sensibilidade política do público, e ainda mais, por não serem realmente indispensáveis. Uma destas é a da cobrança de taxas pelo uso dos ascensores que sobem das duas margens do rio até ao tabuleiro, e assim permitem a travessia pêlos peões, através da Ponte, de uma para a outra margem; taxas donde provém as receitas a que V. Ex.ª alude. Os seus principais usuários são. naturalmente, os trabalhadores da beira-rio; pois bem, a estes cobra-se dinheiro, enquanto os 'automobilistas usam gratuitamente da mesma obra de todos os bens maiores despesas que em seu benefício há que suportar. Se isto é democracia, só pode ser democracia técnica, porque não c da antiga nem da orgânica . . .

O Orador: -O decreto que instituiu a cobrança de taxa de utilização quanto aos ascensore justificou a medida pelo facto de a sua exploração exigir gastos com o pessoal que os iria manobrar. De facto, a receita pouco excede a despesa com o pessoal, segundo julgo. Muito obrigado a V. Ex.ª pela valiosa achega.

O Sr. Pinto de Mesquita: - V. Ex.ª autoriza-me curta interrupção?

Orador: - Tem a bondade.

Concordo inteiramente também em que tal argumento seja de aplicar a outras pontes em condições semelhantes.

Entre os argumentos a favor dessa doutrina, V. Ex.ª e muito explicavelmente pela sua índole subjectiva minha, omitiu uni outro já aqui referido por mim. Aquele a que a fantasia me conduziu, certa hora em reconciliação com a estética abstracta, ante a beleza das linhas da ponte erguendo-se do aperto das margens, a um tempo, escarpadas e virulentas. A sugestão de Vénus surgindo da concha aquática.

Consola-me, dentro da lógica dessa metáfora e tanto basta -, conceder-me V. Ex.ª que muicu a ponte possa converter-se numa Vénus venal.

O Orador: - De facto, não aludi ao argumento estético-abstracto, tão do agrado de V. Ex.ª. Se não o fiz, porém, foi apenas por considerá-lo assunto à margem, não à margem do Douro, evidentemente, mas marginal na linha de considerações que venho expendendo. Os meus agradecimentos pelo vosso aparte, que é uma homenagem à beleza da obra e à valorização da paisagem . . .

Voltando ao tema, analisarei o caso da ponte de Vila Franca. - Na resposta à nota de perguntas que formulei ao Governo publicada no Diário das Sessões n.° 88, de 7 de Novembro do 1967, afirma-se que, "considerando os juros; do capital investido e as despesas de exploração e conservação não está ainda amortizado o custo da Ponte do Marechal Carmona".

Em nova resposta, desta vez à nota de perguntas do Sr. Deputado .Engenheiro Amaral Neto, informa o Ministério das Obras Públicas, em 7 de Dezembro último, que é de 4 por cento a taxa de juro considerada para o cálculo do capital investido, que foi de cerca de 150 000 contos".

Não vejo razão para descrer d informação autêntica, porque subscrita pelo Governo e constante do Decreto-Lei n.º 38 622, de 30 de Janeiro de 1952, de que o custo inicial da obra foi de "cerca de 130 000 contos", valor que veio a ser precisado em 134 000 contos, conforme informação do Ministério das Obras Públicas que atrás citei.

Os encargos de exploração e conservação da Ponte, totalizaram até ao fim do ano transacto 16 827 820$90. Somados ao custo inicial, dão 144 827 820$90.

Como a receita cobrada no mesmo período atingiu 162 725 31)7$, temos um saldo positivo da exploração de 17 897 576$10.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E os juros de 4 por cento a que se refere a resposta às notas de perguntas citadas?

Quando se restabeleceu a portagem em 1952, o Governo justificou a medida no próprio relatório do Decreto-Lei n.° 38 622, declarando que a receita se destinava a cobrir os pesados encargos da manutenção, conservação e renovação. Não mencionou, nem o poderia legitimamente fazer, encargos financeiros que não existiam, custeada como foi a obra pelas dotações normais da Junta Autónoma de Estradas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A adição de cargos de juros, que só agora vejo mencionada, é manifestamente descabida. Legítima, sim, no caso da Ponte Salazar, financiada com produto de empréstimo externo. No caso de Vila Franca, porém, torna-se abusiva e, como tal, não é do considerar.

De reato, a adoptarem-se: para os juros os critérios elásticos que andam referidos quanto ao custo inicial - de 130 000 contos em 1952, já o vemos hoje aumentado para, 150 000 e até 175 000 contos! -, é natural que, para o ano, em resposta a outra nota de perguntas, me seja respondido que o juro já aumentou pura 6 ou 8 por cento, depois que há a contar com prémios de transferência de Vila Franca sobre Lisboa, e assim sucessiva e indefinidamente . . .

Mas, mesmo que se considere ainda inoportuna a abolição, dado o refluxo, embora moderado, que pudesse ter na exploração da Ponte Salazar e, por consequência, na diminuição de réditos que são contrapartida de pagamento de encargos externos, não pode negar-se aos povos que utilizam a ponto de Vila Franca uma satisfação, por mínima- que seja. Estaria neste caso, e para já, a redução para metade do actual custo da portagem, que, inexplicavelmente, é dupla da cobrada na auto-estrada do Norte.

Vozes: - Muito bem, muito bem!