Muito sensatamente se afirma no relatório:

O que há de notável na comparação entre os dois anos de 1962 e 1966 é que as cifras de bens de consumo, na importação e na exportação, são semelhantes. O Pais não fez progressos, como era de esperar, na produção de bens de consumo. E aí está um mal.

No caso dos produtos alimentares, havia em 1962 nítido saldo a favor da exportação, mas em 1966 a exportação já é menor.

E conclui com esta afirmação:

Aqui está uma das graves consequências da crise agrícola.

Acaso já teremos esgotado toda a nossa capacidade de encontrar soluções que todos aceitaríamos com a dignidade própria de um povo que, simultaneamente, se está batendo em três frentes com galhardia tal que está granjeando a admiração do mundo civilizado e não olha a sacrifícios até à vitória final?!

Atrevo-me a fazer algumas considerações acerca do ciclo cereais-farinha-pão, convicto, como estou, de que algo parece não funcionar bem, dentro de um artificialismo que urge corrigir para servir melhor a Nação, porque ao nível nacional é mister proceder a uma profunda revisão de toda a problemática da produção e industrialização dos cereais panificáveis, tradicionalmente cultivados no continente, e que, para certas regiões, constitui a base da alimentação das suas populações.

O consumo médio anual de trigo, milho e centeio destinado à alimentação das populações do continente, segundo estimativas oficiais, é calculado:

Toneladas

Trigo 650 000

Centeio 141 000

Soma l 146 000

No continente, a produção média anual dos referidos cereais foi:

Comparando o consumo médio anual do trigo, milho e centeio com a produção média anual, por evidente se deduz o que tem sido necessário importar para fazer face ao déficit verificado.

Não haverá possibilidade de reduzir esta verdadeira sangria em divisas?

Pelo Decreto-Lei n.° 27 952, de 14 de Agosto de 1937, foi autorizada a incorporação de milho e centeio, valorizados ao mesmo preço do trigo. Com esta medida pretendia-se criar receitas destinadas à lavoura, através de um bónus para os adubos, e, simultaneamente, fomentar a cultura do trigo, sem alteração do seu preço.

Os bónus de adubos concedidos durante vários anos atingiram a média anual da ordem dos 100 000 contos, provenientes do Fundo de Abastecimento.

Em 1940 - Decreto-Lei n.° 30 579, de 10 de Julho de 1940 - são estabelecidos ires preços diferentes para a farinha de 2.ª qualidade com a seguinte diferenciação: preços mais elevados nas zonas tradicionalmente produtoras de milho e centeio e o mais baixo na cidade de Lisboa e concelhos de Oeiras e Cascais.

Daqui resultou que se estabeleceu uma espécie de statu quo, em que as farinhas de 2.ª qualidade não invadiriam a região das ramas de trigo - o Alentejo. Em contrapartida, as farinhas de trigo não concorreriam nas regiões tradicionalmente produtoras dos cereais - milho e centeio.

Como a manutenção do pão de 2.ª acarretava um prejuízo anual superior a 100 000 contos, suprido com os fundos do Fundo de Abastecimento, foi publicado o Decreto-Lei n.º 36 993, de 31 de Julho de 1948, que acabou com o fabrico da farinha espoada de trigo de 2.ª qualidade.

Até à promulgação do regime cerealífero para 1963-1964. existiam no continente, como é do conhecimento geral, três tipos de farinha espoada de trigo, com os seguintes valores técnicos de extracção:

Farinha extra:

Peso do hectolitro - 8 pontos = 70 a 72 por cento.

Peso do hectolitro - 2 pontos = 76 a 78 por cento.

Farinha de tipo corrente:

Peso do hectolitro + 4 pontos = 82 a 84 por cento.

A partir de então passou a haver apenas dois tipos de farinha:

1.ª qualidade - correspondente à farinha extra.

2.ª qualidade - correspondente a uma farinha de tipo intermédio, entre as farinhas tipo extra e tipo corrente.

Todavia, com a publicação do Decreto-Lei n.° 45 223, de 2 de Setembro de 1963, os dois tipos de farinhas espoadas de trigo foram valorizados aos seguintes preços:

Farinha de 1.ª qualidade, a 5$40/kg, com diversos formatos de pão e preços;

Farinha de 2.ª qualidade, a 3$50/kg, subsidiada pelo Fundo de Abastecimento em $44/kg, com vários preços para o pão vendido ao público: 1$70 em unidades de 500 g e 3$40 em unidades de l kg, para Lisboa, Oeiras e Cascais; 1$70 em unidades de 500 g e 3$30 em unidades de l kg, no resto do País.

Para os diversos tipos de farinha foram estabelecidas várias taxas de panificação, a saber:

Máxima da farinha espoada de trigo, 2$60/kg.

Mínima da farinha espoada de trigo, 1$l2/kg.

Única para a farinha de ramas de trigo, $60/kg.

Com a criação do artificialismo (1942) das farinhas espoadas de trigo - farinhas vendidas abaixo do preço do custo de produção, com taxas de panificação mais elevadas das farinhas espoadas de trigo do que as das farinhas de milho e centeio, veio contribuir para o aumento do consumo das farinhas espoadas de trigo nas regiões tradicionalmente consumidoras de milho e centeio.