as suas características e adaptar em relação a elas as regras do fabrico. Ora é este facto que, segundo cremos, poucas vezes se verifica na prática.

Em anos de fraca produção, nos quais é necessário recorrer a importações consideráveis de trigos norte-americanos ou canadianos, geralmente de elevado valor tecnológico, ainda as moagens podem constituir lotes mais equilibrados e produzir farinhas de melhor qualidade.

Aliás, o desconhecimento prévio das características dos trigos que laboram, por parte das moagens, nem sempre lhes permitirão constituir os lotes da maneira mais conveniente, e, portanto, à indústria de panificação nem sempre são entregues, por longos períodos, farinhas de características homogéneas, o que é um grande inconveniente para a manutenção de um tipo regular de fabrico.

For outro lado, o 4.° Congresso Internacional dos Cereais e do Pão, realizado em Viena (1966), alertou o Mundo sobre:

À possível escassez, em futuro próximo, do trigo relativamente às necessidades normais do abastecimento geral;

O regresso das moendas a extracções mais elevadas, com vista ao melhor aproveitamento do cereal e da totalidade das suas propriedades de nutrição;

A melhor técnica de fabrico de pães de centeio, cujo valor de cereal, farinhas e respectivos pães cientificamente enaltecem;

Futura aplicação e valor de outros cereais capazes de contribuírem para a normalidade do abastecimento de pão;

Fabrico de pães menos brancos e de pães quase integrais por deterem propriedades naturais apreciáveis;

Condicionar à automatização o fabrico de pães de família para garantir o abastecimento e melhoria dos padrões oficializados;

Produção obrigatória de pães cientificamente enriquecidos para alunos das escolas dos vários graus de ensino;

Necessidade de pães dietéticos e de pães especiais próprios para a recuperação de certas carências alimentares.

Ensaios realizados por técnicos portugueses levam-nos a concluir que reúne interesse o pão de mistura - trigo, milho e centeio -, desde que se respeitem as percentagens mais adequadas não só ao lote de farinha que se pretende, como à região a que se destinam, de acordo com os hábitos das respectivas populações.

Torna-se, pois, necessário definir as características das farinhas espoadas de milho e de centeio.

Inclusive, para as regiões onde predomina a alimentação com base na farinha de milho, impor o seu enriquecimento para completar o que falta em relação à farinha de trigo isenta de mistura.

A indústria de panificação procurou fomentar o fabrico do pão de 1.ª qualidade, porém, o baixo nível de vida das populações que vivem nas regiões mais deprimidas por falta de actividades remuneradoras começaram a consumir menos pão. A partir desta realidade, alguns industriais verificaram que o único recurso era o fabrico do pão de mistura.

No pão de mistura de farinha de trigo, centeio e milho, ou de apenas duas destas farinhas, um dos componentes não deve entrar na mistura com mais de dois terços do total das farinhas utilizadas, sem prejuízo do disposto no artigo 75.° do regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.° 42 477, de 29 Agosto de 1959.

Foi, pois, a partir desta data que algumas padarias da Estremadura e do Ribatejo iniciaram o fabrico do pão de mistura, que parece estar a ser preferido em detrimento do pão de 2.ª qualidade.

Para dar uma ideia do caos a que todos estes artificialismos legais conduziram, poderei informar a Câmara de que diversos industriais de moagem de ramas do Alentejo paralisaram as suas fábricas, para passarem a vender farinha espoada de trigo de 2.ª, a 3$80/kg, obtendo desta forma maiores lucros (três vezes mais) com as moagens paralisadas, vendendo farinha espoada de trigo de 2.ª em vez de laborar os cereais nas suas moagens (provenientes de trocas, à maquia ou adquiridos à Federação Nacional dos Produtores de Trigo).

Resumidamente, referirei algumas das principais vantagens que resultam do fabrico do pão de mistura: Aumento do consumo de farinhas de milho e centeio, para alcançarem os objectivos, sistematicamente, preconizados em todos os regimes cerealíferos; Redução de importação de trigo; Valor energético do pão de mistura superior ao do pão de trigo de 2.ª qualidade; A população de menor poder de compra dispor de um pão de melhor qualidade; Haver margem para aumentar a taxa de panificação em relação a taxa praticada para a farinha de 2.ª qualidade.

Se as coisas se encaminham neste sentido, serei levado a concluir não haver justificação para o fabrico de pão de 2.ª qualidade, visto a farinha de 2.ª qualidade ser subsidiada actualmente pelo Fundo Especial de Compensação de Farinhas em $60/kg.

Elementos fidedignos levam à conclusão de que com a fabricação da farinha de 2.ª, nos anos de 1964 a 1966, os encargos suportados pelo Fundo de Abastecimento atingiram cerca de 300 000 contos, isto é, à razão de 100 000 contos por ano, de que apenas beneficiou a indústria organizada, ou sejam, as grandes concentrações de moagens de espoadas.

A actual conjuntura económica de que não nos pudemos alhear e o estado de guerra em que nos encontramos, em meu modesto entender, justificam todas as medidas que tenham por objecto evitar a sangria de divisas a que o engenheiro Araújo Correia se refere, com a autoridade e prestígio que todos nós, justamente, lhe atribuímos.

Tenho para mim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que nesta emergência em que o País se encontra é de aconselhar o fomento do fabrico do pão de mistura.

Além de se reduzir o consumo do trigo, o pão de mistura evitaria que aumente ainda mais o consumo das farinhas espoadas de trigo nas regiões tradicionalmente consumidoras de milho e centeio.

De igual modo aumentaria consideravelmente o consumo das farinhas de milho e centeio, pelo que se evitava que nos anos de produção excedentária estes cereais venham a ser exportados com elevados prejuízos suportados pelo Fundo de Abastecimento. Talvez até se conseguisse transformar em receita o que desde sempre tem constituído pesado encargo à Nação.