universitário e no Governo. Isto explica a sua coerência de pensamento e de acção.

Pode, uma ou outra vez, ter parado ou seguido por caminhos mais longos para atingir os objectivos a que se dirigia. Era a pressão dos acontecimentos que o abrigava. Logo, porém, que isso lhe era possível, voltava ao caminho que havia de conduzi-lo, segundo o seu plano, à conquista daqueles objectivos. Era o político, com um sentido quase divinatório das oportunidades. Não descoroçoava: mantinha-se na posição à espera de poder realizar os seus fins. A tarefa não era fácil para quem não podia utilizar na sua acção quaisquer meios, mas só os consentidos pela moral e pelo direito. São os limites impostos constitucionalmente à soberania da Nação e que ele, pela sua formação, sempre adoptou para si no desenvolvimento da sua actividade de homem e de governante. Teve sempre o maior respeito pela dignidade humana e pelas instituições que têm como missão defendê-la ou protegê-la.

O povo tinha a consciência disso e daí a emoção que percorreu o País com o temor de o perder. O temor desapareceu quando o País soube que ele ia ser-lhe restituído dentro de breves dias. Surgiu, no entanto, doença mais grave, que o prostrou. A emoção converteu-se em consternação. Como a ciência não podia restituí-lo, apesar de empregar os melhores meios a que era possível recorrer-se em qualquer parte do Mundo, o povo voltou-se para o milagre e ficou, com serenidade, à espera que a Providência Divina respondesse b, sua ansiedade conforme os Seus altos desígnios.

Tudo o que acabo de dizer é dito pelo Chefe do Estado na mensagem que em 26 de Setembro dirigiu ao País e nos considerandos do diploma que em 27 fez publicar no Diário do Governo. Eu só transcrevo alguns passos:

Um problema inesperado e de extrema gravidade surgiu assim para o País e passou a atormentar todos os portugueses, que, com a maior calma, patentearam ao mundo uma maturidade e um civismo consoladoramente notáveis. E, entre todos, o mais atormentado é necessariamente o Chefe do Estado, que de primeiro responsável pelos destinos da Nação passou agora à situação indesejável de responsável único. Todos têm os olhares ansiosamente fixados, aguardando uma solução que mantenha Portugal na marcha firme que vinha trilhando através de inúmeras dificuldades.

E não sendo já admissível para os superiores interesses de Portugal, no momento que vive, adiar por mais tempo a decisão a tomar, decisão que sei teria o pleno acordo do Sr. Presidente do Conselho, se a pudesse manifestar, redigi e mandei para publicação no Diário do Governo de amanhã o seguinte diploma:

Continuando muito gravemente doente o Presidente do Conselho, Doutor António de Oliveira Salazar, e perdidas todas as esperanças, mesmo que sobreviva, de poder voltar a exercer, em plenitude, as funções do seu alto cargo;

Atendendo a que os superiores interesses do País têm de prevalecer sobre quaisquer sentimentos, por maiores e mais legítimos que pareçam, circunstância que obriga à decisão dolorosa de substituir na chefia do Governo o Doutor António de Oliveira Salazar, português inconfundível no pensamento e na acção e benemérito da Pátria, por ele servida genialmente, com total e permanente dedicação, durante mais de quarenta anos, e que, para melhor a servir, de tudo abdicou, numa renúncia completa e única em toda a nossa história de mais de oito séculos;

Tendo ouvido o Conselho de Estado e não devendo adiar por mais tempo essa decisão, é, no entanto, com profunda amargura, só minorada pelo conhecimento, que dele directamente colhi, de que não desejava morrer no desempenho das suas funções, que ... exonero o Doutor António de Oliveira Salazar do cargo de Presidente do Conselho de Ministros, do qual manterá todas as honras a ele inerentes. E, para o substituir, nomeio ... o Doutor Marcelo José das Neves Alves Caetano.

Não podia fazer-se em palavras mais fortes o elogio do Presidente Salazar, nem exprimir em termos mais dolorosos o sentimento de o exonerar.

No dia 27, depois de constituído o novo Governo, o Presidente do Conselho, ao entrar no exercício das funções respectivas, dizia, em discurso dirigido ao País, aludindo às suas hesitações em aceitar o esmagador encargo de suceder ao Presidente Salazar:

Os homens de génio .aparecem esporadicamente, às vezes com intervalos de séculos, a ensinar rumos, a iluminar destinos, a adivinhar soluções ... O País habituou-se durante largo tempo a ser conduzido por um homem de génio ...

E logo a seguir:

... de hoje para diante tem de adaptar-se ao Governo de homens como os outros.

Subscrevo as primeiras palavras transcritas. Não posso aceitar as últimas. Por maior respeito que tenha pela sua modéstia, não posso aceitar que o novo Presidente do Conselho se inculque como um homem comum, como um homem como os outros. Quem fez na vida a escalada que ele fez não pode julgar-se um homem comum, um homem como os outros. Foi bem «escolhido para exercer o cargo em que sucede ao Presidente Salazar.

Não é o momento de fazer o seu elogio; mas é o de afirmar a esperança do País nos seus talentos, nas suas qualidades de trabalhador infatigável, na sua formação e na sua preparação política.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - «A ordem pública, condição essencial para que a vida das pessoas honestas possa decorrer com normalidade», diz no seu discurso o Presidente do Conselho, «será inexoràvelmente mantida.

A nossa política ultramarina não se modificará.

A nossa política interna manter-se-á, quanto aos princípios gerais que a informam, embora possam modificar-se os métodos de acção a utilizar.

O Presidente do Conselho pede um crédito de confiança que permita ao Governo estudar os problemas e o sentido das soluções. O País conceder-lhe-á largamente e de boa vontade.

Termino, pedindo para as nossas forças armadas que se batem na defesa da ordem, do território e da Pátria um voto de aplauso e de louvor. São portugueses que querem continuar a sê-lo, com sacrifício da própria vida!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - É costume fazerem-se nesta primeira sessão várias notas sobre os acontecimentos mais