Com efeito, está-se na fase da reforma cio direito criminal substantivo, e só depois desta concluída haverá que cuidar du reforma processual. Mas não nos iludamos. Por mais cuidado que haja em simplificar os termos do processo e em fechar as portas às "habilidades" das partes, o processo penal não poderá ultrapassar certos limites neste aspecto, porque há e há-de haver sempre domínios, fases, que são estritamente indispensáveis à defesa dos direitos e ao apuramento da verdade, algumas até com assento constitucional: a instrução contraditória, por exemplo.

As nossas leis criminais, nomeadamente, adjectivas, estão impregnadas de espirito humanista e liberal e crê-se que ele continuará presente em quaisquer reformas legislativas, dada a formação cristã e a maneira de ser dos Portugueses.

Para já, estará indicado um esforço no sentido de limitar os recursos e certos casos, e nesta orientação se situa o projecto de proposta de lei em estudo, restrita aos recursos a interpor dos acórdãos das relações proferidos em processo correccional.

Adiante, no exame na especialidade, a atenção desta Câmara recairá sobre os termos concretos da limitação proposta.

Nas ideias acabadas de expor se filia igualmente a limitação do recurso a que alude o artigo 2.° do projecto. No campo do direito penal substantivo, o projecto de proposta de lei versa sobre os crimes de furto e de dano voluntário, actualizando os valores referidos nos artigos 421.°, 430.º e 472.° do Código Penal, por forma a ajustá-los à gravidade das penas correspondentes.

É patente a inadequada estruturação do crime de furto previsto e punido no artigo 421.º, com vários escalões de penas consoante o valor da coisa furtada, ao arrepio do que se impõe, dando ao tribunal maiores possibilidades na fixação da pena, consoante sucede em códigos penais modernos, como o italiano (artigo 624.º), o grego (artigo 372.°), e no projecto da parte especial do futuro Código Penal Português (artigo 196.º).

Simplesmente, não é agora a altura de alterar a estrutura du crime de furto, mas apenas n de encarar a actualização dos valores referidos nos vários números do artigo 421.º, pois é manifesto que eles são hoje demasiado baixos, dada a elevação geral dos preços e a consequente diminuição do poder de compra da moeda. De modo que as penas cominadas sito hoje excessivamente severas, severidade que se avoluma nos crimes qualificados do furto.

A actualização desses valores projecta-se favoravelmente em vários domínios: baixam os limites das penas aplicáveis c dai resulta a correspondência do forma processual menos solene, o que permitirá a concessão de caução em casos em que esta não era possível, ou a dispensa da caução em casos em que era exigível; logo, menos incómodos e restrições impostas aos arguidos e menor número de casos de prisão preventiva, com todas as vantagens inerentes para a pessoa dos arguidos e a administração prisional; por outro lado, crimes que até agora são julgados por um tribunal colectivo passam a ser julgados pelo juiz singular, com evidente economia processual e redução das despesas com as deslocações dos juizes, corregedores e adjuntos às comarcas; por outro lado, ainda, maior celeridade processual.

E como há outros crimes contra o património puníveis com as penas do crime de furto, consoante o valor - por exemplo, burla (artigo 451.°), abuso de confiança (artigo 453.°) -, a actualização proposta tem ampla repercussão.

O que fica dito quanto ao crime do furto poderá dizer-se quanto ao crime de dano voluntário, sendo certo que os valores referidos no artigo 472.° se encontram ainda mais desactualizados.

Sendo assim, o propósito do projecto em apreciação parece justificado.

Exame na especialidade § 1.° Processo penal Já ficou assinalado na apreciação na generalidade (n.° 4) o motivo determinante da alteração proposta ao artigo 272.º do Código du Processo Penal, com o aditamento de três parágrafos.

Devem ter impressionado, sobretudo, as hipóteses hoje muito frequentes de acidentes de viação - nos quais podem intervir, como arguidos, a generalidade das pessoas - e que, sem as providencias agora propostas, correm o risco de ficar presas algumas horas ou até alguns dias, consequência tanto mais inconveniente quanto é certo que em grande número de casos não se apurará a sua culpabilidade ou, apurando-se, a pena não será de prisão efectiva.

Mas não se tem em vista apenas os crimes involuntários, a que corresponda caução, mas também outros crimes de reduzida gravidade, culposos ou dolosos - justamente aqueles em relação aos quais é possível prestar termo de identidade (artigo 291.º do Código de Processo Penal).

A libertação cio detido, prevista no § 1.° proposto, será acompanhada da observância do disposto no § 2.° do artigo 557.º - advertência feita para que compareça no tribunal no primeiro dia útil imediato, à hora que lhe for designada, sob pena de, faltando, incorrer no crime de desobediência.

Atém disso, antes da libertação do detido, proceder-se-á, segundo o projecto, à apreensão do instrumento que serviu à prática da infracção (veículo automóvel, por exemplo), a qual assim funcionará como garantia da prestação do caução.

Parece, todavia, que a apreensão deverá ser facultativa, deixando-se ao critério da autoridade ou agente de autoridade levá-la ou não a efeito, consoante as concretas necessidades de assegurar a presença do arguido.

O benefício da libertação do detido não funciona compreensivelmente em relação aos delinquentes de difícil correcção, vadios ou equiparados, libertados condicionalmente, de identidade desconhecida ou indocumentados para o exercício da actividade de que resultou o facto ilícito.

De harmonia com o exposto, esta Câmara propõe que o § 2.º do artigo 272.° fique assim redigido:

§ 2.º Antes da libertação do detido, poderá proceder-se à apreensão do instrumento que serviu de prática da infracção, a qual cessará com a prestação da caução, a não ser que por outro motivo, deva ser mantida. Este preceito encontra-se assim redigido:

Se houver diferentes réus, para cada um se formularão, em separado, os respectivos quesitos.