Para, além desses pontos essenciais, Sr. Presidente, apontei expressamente três deficiências: uma, ligada à falta de definição qualificada de uma política comercial; outra, à falta de actualização dos dispositivos legais aplicáveis à campanha; e uma terceira, de reprovação do clima emocional que se está a criar, fautor de confusão e comprometedor da eficácia da mesma campanha. Claro que, limitada a questão a este aspecto, a minha achega não tinha qualquer relevância senão aquela que derivava, por um lado, da generosidade da Câmara ao escutá-la e, por outro lado, da expressão que a mesma tomou na opinião pública através dos órgãos de informação e através das adesões que recebi dos sectores interessados. E só assim se explica que me veja forçado hoje a voltar ao assunto. Lamento ter de o fazer sem que antes, porque a iniciativa era sua, sobre o assunto tivesse falado o nosso colega Pontífice de Sousa.

Seja como for, Sr. Presidente, desde que o assunto foi trazido a esta Casa, o problema ficou desde logo colocado em nível nacional. O problema revestiu-se de uma importância que não pode ser esquecida, e quando um assunto é trazido a esta Casa há que respeitar aquilo a que podemos chama as «regras do jogo». Problema trazido aqui postula o dialogo com o próprio Governo. O Governo pode dialogar com a Assembleia, e a Assembleia com o Governo, mas a Assembleia não dialoga com os serviços, a Assembleia não pode expor-se a críticas irresponsáveis de serviços não qualificados para tratar os assuntos que os Deputados aqui trazem.

Considero, Sr. Presidente, desrespeitosa nesse plano e incorrecta a nota oficiosa da Secretaria de Estado do Comércio. E digo porquê. E que, tendo o problema sido trazido aqui, ao Governo impunha-se o dever de responder à Assembleia O Governo não é livre de ignorar que o assunto foi tratado por dois Deputados. V. Ex.ª sabe quanto me tenho batido pelo prestígio da Assembleia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª e a Câmara sabem como o eminente Chefe do Governo considera e respeita as nossas prerrogativas. Mas há sectores governativos que se mantêm apegados, lamentavelmente, Sr. Presidente, a uma auto-suficiência e sobranceria, em relação às quais lavro o meu protesto.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: o Governo escusou-se ao confronto de opiniões com a Câmara. O Governo, que é um órgão de soberania, ignorou a posição tomada por outro órgão õ e soberania, e eu não posso responder, recuso-me terminantemente a responder às incorrecções, às gracinhas fáceis, às insinuações maldosas de serviços desqualificados.

O Sr. Castro Fernandes: - Desqualificados ou não qualificados?

O Orador: - Não qualificados, se V. Ex.ª o permite, para não azedarmos excessivamente a questão.

Dessas declarações não qualificadas, é evidente que tirei apenas uma nota, que foi a de que o Sr. Director dos Serviços de Fiscalização das Actividades Económicas e «sus muchachos» têm trabalhado noite e dia.

O Sr. Albilo dos Reis: - O termo não é parlamentar, Sr. Deputado.

O Orador: - Porquê?

O Sr. Albino dos Reis: - Não tenho que dizer porquê.

O Orador: - Perdão. Quem faz uma afirmação tem de a justificar.

O Sr. Cazal Ribeiro: - Como estamos em Portugal, talvez possamos dizer «os seus rapazes».

O Orador: - Pois seja. Mas dizia eu que dessas declarações prestadas à imprensa apenas fixei aquela que se referia ao labor dos serviços de fiscalização. E então lembrei-me de uma história. Há algum tempo alguém se referia à circunstância de uma personalidade altamente qualificada não encarar com esclarecido critério os problemas que lhe estavam afectos. Pretendendo justificá-la, outrem dizia: olhe que é uma pessoa que trabalha muito. Retorquiram-lhe: Mas aí é que está o mal. È que a pessoa não é esclarecida e trabalha muito. A nossa sorte estaria em que não trabalhasse nada. Por isso, Sr. Presidente, não é preciso trabalhar muito e mal. O essencial é que se trabalhe muito e bem. E, se não for possível trabalhar muito e bem, que se trabalhe pouco, mas sempre bem.

E agora vamos fazer alguns apontamentos à nota oficiosa da Secretaria de Estado do Comércio.

Antes de mais a nota, quanto a mim, expressa uma estranha noção da acção governativa. Com efeito, a nota coloca-se logo, na sua entrada, numa atitude de passividade. A Secretaria de Estado do Comércio entende que nada tinha a fazer, na medida em que nada lhe houvera sido solicitado.

Considero isto fora das coordenadas válidas de uma acção governativa eficaz. Governar é prever, governar é tomar a tempo e horas adequadas providências. Governar não é esperar por nada, é desencadear os procedimentos necessários à realização do bem comum.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Nessa resenha permita V. Ex.ª que é de lembrar-se sempre quanto «governar é descontentar».

O Orador: - Dizia eu que esta posição me parece bastante estranha. Por outro lado, a nota oficiosa, depois de se colocar nesta posição de passividade, acusa frontalmente a organização corporativa e afirma que ela não teve, nesta emergência, uma acção válida para usar um termo em moda. E de modo muito especial é posta claramente em cheque a Corporação do Comércio.

Sr. Presidente: Considero isto profundamente lamentável. Lamentável na medida em que, mesmo que a organização tivesse tido uma falha na sua dinâmica, não me parece que a tecnocracia dos serviços, a coberto da autoridade governamental, tivesse qualidade para lhe fazer reparos. Mas, Sr. Presidente, tais reparos são ao mesmo tempo injustificados e falsos. Merece uma palavra de desagravo o Sr. Presidente da Corporação do Comércio, que. desde a primeira hora, com o seu entusiasmo, com a sua devoção de dirigente corporativo dos mais prestigiosos, com a sua devoção política ao Regime, acompanhou toda a acção desenvolvida pela Inspecção-Geral das Actividades Económicas. Todos nós o vimos e ouvimos na televisão, apresentando as suas razões, afirmando a sua solidariedade com a política do Governo. O Sr. Presidente da Corporação do Comércio, numa reunião realizada na passada terça-feira no Porto, limitou-se, com rara elegância, aprumo moral e alta dignidade, a ler a correspondência trocada entre a Corporação e a Secretaria de Estado do Comércio, abstendo-se de formular qualquer juízo. Tam-