Liberdade religiosa

O princípio da liberdade religiosa foi introduzido em Portugal pela Lei da Separação do Estado des Igrejas, aprovada pelo Decreto de 20 de Abril de 1911, embora a Constituição de 1822 (artigo 25.º) e a Carta Constitucional (artigo 6.º) já permitissem aos estrangeiros o culto particular ou doméstico de religiões diferentes da católica e tanto a Carta (artigo 145.º, § 4.º) como a Constituição de 1838(artigo 11.º) fixassem a regra de que ninguém podia ser perseguido por motivos de religião, contanto que respeitasse a do Estado. Repetido depois pela Constituição de 1911 (artigo 3.º, n.ºs 4.º a 10.º) e recebido pela Constituição vigente (artigos 8.º n.º 3.º, 45.º, 46.º e 139.º), o princípio pode considerar-se hoje aquisição definitiva do património jurídico e cultural do País.

O Decreto de 20 de Abril de 1911, porém, ao mesmo tempo que separava o Estado da igreja católica e reconhecia a liberdade de consciência, submetia as confissões religiosas a um regime que dific ultava a sua acção. Em princípio, o exercício dos vários direitos em que a liberdade religiosa se desdobra ficaria submetido às normas comuns. Mas em diversos pontos estas eram derrogadas pôr preceitos que atribuíam à liberdade religiosa um tratamento de desfavor. Assim, do mesmo passo que se confiscava grande parte dos bens da igreja católica e que se estabeleciam disposições lesivas da natural autonomia interna das confissões religiosas e da igreja católica em particular, não se reconhecia personalidade jurídica às confissões e proibiam-se as associações puramente religiosas, restringiam-se os direitos patrimoniais das corporações encarregadas do culto, limitava-se a liberdade de culto e de práticas religiosas ...

Vários diplomas posteriores, designadamente o Decreto n.º 3856, de 22 de Fevereiro de 1918, e o Decreto n. 11 887, de 6 de Julho de 1926, foram afastando as disposições mais gravosas da Lei da Separação e procuraram remediar as consequências da sua aplicação.

E com a Concordata a igreja católica acabou por ver satisfeitas as suas aspirações.

Todavia, não voltou a tentar-se, depois daquela lei, uma reformulação sistemática das normas fundamentais relativas à liberdade religiosa, que a variedade dos diplomas que actualmente regulam a matéria torna conveniente. Por outro lado, o próprio regime fixado para a igreja católica, justificando-se pela posição peculiar da religião católica, hoje constitucionalmente reconhecida como religião da Nação Portuguesa, fez avultar as deficiências do tratamento conferido às outras confissões.

Na prática, estas deficiências fazem-se sentir, sobretudo no domínio do direito de associação. As confissões religiosas não católicas têm vivido uma situação de mero facto, com prejuízo para elas e para o próprio Estado. E, se é certo que o Código Administrativo, nos seus artigos 449.º e 450.º, reconhece personalidade jurídica, às associações cujo fim principal seja a sustentação do culto, mediante o simples registo da participação escrita da sua

constituição, entendeu-se que este regime pressupõe o prévio reconhecimento da confissão, de maneira que tais preceitos não têm funcionado quanto às associações religiosas não católicas.

Na proposta de lei que o Governo agora tem a honra de apresentar à Assembleia Nacional proeurou-se definir e sistematizar as normas fundamentais relativas à liber-