É evidente que as culturas a que os homens pertencem - e por cultura entendemos aqui, no sentido antropológico, um conjunto de modos de comportamento social, a moral, as instituições, os utensílios, as técnicas e os Valores - têm evolucionado sempre. Em todas as épocas houve luta entre as tradições e as inovações.

No decorrer dos séculos as tradições foram-se desgastando e as inovações, começando por alterar hábitos e costumes, foram-se tornando elementos culturais.

Mas agora, sob a pressão das técnicas e das tecnologias que aceleradamente estão a depauperar o ambiente natural e a criar ambientes artificiais, a estrutura social modifica-se.

A resistência à mudança sempre foi grande, até que tecnologias unificadas invadiram todas as culturas, as do Ocidente e as do Oriente. É tão grande o impacte da tecnologia que muitos homens, que mergulharam em estádios culturais análogos àqueles que a civilização mediterrânica teve há muitos séculos, não se eximiram a ele e sofreram choques psicológicos que põem em perigo a sua existência.

É problema tão importante este que a U. N. E. S. C. O. edita uma revista Impact( que já vai no 81.º fascículo - o último é o n.º 3 do volume XX -, 3.º trimestre de 1970), cujo subtítulo é «Ciência e Sociedade».

Povos europeus, como os de Portugal e de Espanha, com tanta tradição comum cimentada numa convivência de séculos e, ultimamente, pelo rigoroso cumprimento do Pacto Peninsular de 1939, têm todo o interesse em se reunirem para examinarem em conjunto fraterno as implicações do impacte da ciência e da tecnologia sobre as suas estruturas sociais.

xergar até ao princípio dos tempos o caminho marcado na História pelas pegadas de avós e avoengos.

Tentou-se analisar neste parecer o surgir de uma nova infra-estrutura social, mas não foi possível fugir à tentação de ligar o hoje com o ontem imediato. Não se voltou a cara para o passado, mas não foi possível deixar de olhar de soslaio para os últimos trinta anos que a Humanidade viveu no propósito de desentranhar do desconhecido dois domínios vastíssimos que são hoje - e serão ainda amanhã! - prodigioso terreno para as suas actividades científicas e tecnológicas: o mundo atómico e o espaço extra-atmosférico.

Há muitos milhares de anos que o adulto transmite ao jovem o que as gerações passadas foram conservando e o tempo deixou acumular. Desde que há escolas tem sido sua preocupação integrar as crianças na cultura dos seus maiores, apontando-lhes como exemplos a seguir os varões de Plutarco.

Admiráveis são as tradições, comuns às duas pátrias peninsulares, qu e ao longo do tempo forjaram histórias refulgentes!

Imobilizá-las, porém, ao ponto de desprezar as inovações é condenar Portugal e Espanha a ficarem à margem de um mundo que estugou o passo mercê de tecnologias novas. Os desejos veementes da Câmara exprimem-se no sentido da instauração de uma nova política científica a iluminar a Convenção que, em boa hora, foi assinada pelos dois Governos.

Neste termos:

A Câmara Corporativa, no seguimento do seu parecer n.º 17/X sobre o Acordo Cultural entre Portugal e a Espanha, assinado em Madrid em 22 de Maio de 1970, publicado na sua acta n.º 48, de 9 de Outubro próximo passado, dá inteira concordância na generalidade à Convenção Geral sobre Cooperação Científica e Tecnológica entre as duas nações peninsulares, assinada em Madrid naquela data.

Exame na especialidade A Câmara, ao exprimir sem reservas a sua aprovação na generalidade do texto da Convenção bilateral que lhe é presente, só fará três reparos, de mero pormenor, em relação a alguns artigos.

A Câmara considera, efectivamente, que na sua generalidade os artigos foram redigidos em termos cautelosos mas perfeitamente exequíveis, não tendo de surgir modificações substanciais.

Parece à Câmara que a cooperação que se deseja incrementar para proveito mútuo dos dois países peninsulares é oportuna. De facto, é de temer que a taxa do incremento tecnológico continue a ser mais alta nos países industrializados do que nos países em vias de desenvolvimento. Destarte, tudo se deve tentar para impedir que venha a acentuar-se, em todos os domínios da produção, o desvio tecnológico entre os dois grupos de países.

Considera a Câmara que o trabalho em conjunto de peritos das duas nações irmãs poderá ser altamente fecundo, principalmente se for concretizado em tarefas previamente organizadas, respeitantes a pontos concretos de interesse para as duas partes contratantes.

O artigo 1.º da Convenção está redigido em termos latos que podem abarcar quaisquer acordos desses empreendimentos de cooperação bilateral.

O artigo 2.º ao indicar algumas das formas de cooperação, todas correntes e generalizadas em convenções e acordos internacionais deste tipo, poderia Ter sido ampliado com vantagem se houvesse referido a conveniência da realização de cursos periódicos luso-espanhóis de reciclagem, tanto respeitantes à actualização dos conhecimentos científicos e de métodos tecnológicos como ao emprego de novos materiais.

E à Câmara igualmente parece Ter sido vantajoso referir explicitamente a possibilidade de uma unificação de nomenclatura técnica e tecnológica, porquanto os neologismos das duas línguas nem sempre têm sido importados da mesma literatura científica. É preciso não esquecer que não é possível exprimir ideias novas com vocábulos forjados em épocas antigas. A experiência já colhida com o envio de missões fora do País e com recepção de delegações de peritos estrangeiros, com fins de cooperação em projectos inter-