A Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948, estabelecendo o princípio da actualização de rendas por avaliação fiscal, consignou ao mesmo tempo um regime excepcional para os prédios destinados a habitação em Lisboa e Porto, não facultando aos senhorios, transitoriamente, o recurso a essa avaliação.

Seguindo o rumo traçado por essa lei, o Código Civil vigente erigiu em principio geral, que não hesitou em codificar, o da actualizarão das rendas por meio de avaliação fiscal (artigos 1104.º e 1105.°), mas o decreto-lei que o aprovou declara no seu artigo 10.º que, enquanto não for revista a situação criada em Lisboa e Porto pela suspensão das avaliações fiscais para o efeito da actualização de rendas dos prédio destinados a habitação, mantém-se o regime excepcional da Lei n.° 2030 quanto a esses arrendamentos.

Não obstante ter-se mantido esse regime excepcional, uma vez mais a título transitório, como resulta da redacção daquele artigo 10.°, reconheceu o então Minis tro da Justiça, na exposição que fez em 26 de Novembro de 1966 a esta Assembleia Nacional, que a revisão do problema se impõe com a maior urgência possível, se quisermos apagar a tempo a nódoa de injustiça que subsiste.

2. Dura há quase vinte e cinco anos o regime de excepção criado para Lisboa e Porto e, talvez, por via dele, é hoje mais grave e complexa a situação dos arrendamentos para habitação nestas cidades, como se infere do desenvolvido estudo publicado no n.° 167 do Boletim do Ministério da Justiça.

A estagnação das rendas, que por imposição legal deixaram de acompanhar a elevação do custo de vida, não torna aliciante encaminhar capitais para a construção de casas par arrendar e coloca inúmeros senhorios em situação angustiante perante a satisfação inadiável de encargos fiscais e de conservação dos prédios e até de necessidades da própria subsistência. Por sua vez, os inquilinos de agora têm de sujeitar-se a rendas exageradas, que lhes são exigidas como defesa contra a impossibilidade de actualização futura. E parece estar já a assistir-se à estipulação de rendas progressivas, como antídoto à proibição do recurso à avaliação fiscal.

A grande maioria das rendas deixou de ter uma correspondência, ao menos aproximada, com o justo preço da habitação. Umas, as antigas, são de montante insignificante e até ridículo; outras, as modernas, são muitas vezes excessivas e impróprias dos prédios a que respeitam. Os inquilinos recentes pagam em demasia porque os antigos usufruem de uma regalia coloca os senhorios na posição de suportarem pessoalmente um encargo equivalente a um subsídio de alojamento a que socialmente não deveriam estar obrigados.

A situação actual é profundamente injusta e não é desconhecida; mas não é este relatório, por natureza breve, o local próprio para nos alongarmos na demonstração dessa injustiça. Acrescentaremos sòmente que não podem conceber-se fàcilmente dois regimes jurídicos sobre a ma téria. Se é justo e equilibrado o sistema de avaliação fiscal instituído pela Lei n.º 2030, hoje codificado, não se vê razão para que se mantenha a excepção vigente em Lisboa e Porto - a que tão maus resultados perece estarem ligados.