Dadas as razões que antecedem, afigura-se oportuno alterar o§ 3.º do artigo 183.º do código Comercial, no sentido de não impor uma limitação de votos - excepto no tocante aos titulares de acções com privilégios de voto, hipótese em que se justifica um regime especial -, embora permitindo que os estatutos da sociedade o façam. Deve sublinhar-se que a mudança de forma alguma corresponda a um propósito de restringir a protecção se reconhecem, à luz do que tem mostrado a experiência, entre nós e no estrangeiro, a inoperância de um sistema como o do actual § 3.º do artigo 183.º para essa protecção. As verdadeiras medidas de uma eficaz tutela das minorias são de índole diversa. Ponderar-se-á naturalmente a sua introdução ou reforço no âmbito da reforma do nosso direito das sociedades comerciais. E não se ignora também que várias providências dessa ordem se encontrem já sancionadas pelo diploma respeitantes à fiscalização das sociedades anónimas, acima recordado. Ao mesmo p ropósito obedece a faculdade prevista no título III deste decreto-lei, a que adiante se faz alusão.

De resto, a solução que fica adoptada no título I do presente diploma está conforme com a tendência das legislações mais modernas. Consagram-na, por exemplo, o direito brasileiro (Decreto-Lei n.º 2627, de 26 de Setembro de 1946, artigo 80.º), o direito alemão (Lei de 11 de Setembro de 1965, § 134, alínea 2) e o direito francês (Lei de 24 de Julho de 1966, artigo 177.º) Em numerosas sociedades comerciais ocorrem divergências entre sócios ou grupos de sócios com igual poder de voto. Os estudiosos da matéria não têm deixado de salientar os inconvenientes que a situação comporta, podendo as suas conclusões resumir-se no título de um importante trabalho publicado no estrangeiro: Beco sem saída ou Arbitragem. Mas para a arbitragem ser possível torna-se necessário que os sócios acordem em realizá-la, o que na quase totalidade dos caso não acontece, mercê da natural continuação dos seus radicais diferendos.

Não parece aconselhado que o legislador atribua aos tribunais competência para dirimir toda e qualquer das aludidas divergências. Justifica-se, porém, que sancione a sua intervenção quando elas se mostrem susceptíveis de paralisar o funcionamento da sociedade e, assim, de determinar a respectiva dissolução, a prazo mais ou menos longo. É o que sucede com as divergências relativas às deliberações de nomeação de administradores ou de gere ntes e de apreciação do balanço e contas. Nem será ousadia supor que, em muitos casos, a simples existência de meios de solução forçada desses conflitos concorrerá para atenuar a violência dos mesmos.

A experiência que vai admitir-se talvez aponte ao legislador, no futuro, um passo mais arrojado: a possibilidade de um sócio requerer que a divergência seja decidida por um tribunal arbitral quando a deliberação tenha qualquer outro objecto e se prove que aquela é de molde a ocasionar grave prejuízo à sociedade. Por agora, como a prudência reclamada pelo melindre do tema, o presente diploma, no seu título II, admite tão-só algumas medidas que se julgam apropriadas para as situações consideradas mais instantes. Resolve-se ainda um problema, para que a teoria e a prática têm insistentemente chamado a atenção. É ele o da destituição judicial de administrador ou de gerente, a requerimento de qualquer sócio e com fundamento em justa causa. A solução consta do único artigo que integra o título III do diploma.

Nestes termos:

Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo para valer como lei, o seguinte:

Limitação do número de votos dos accionistas

§ 3.º Os estatutos podem limitar o número de votos de que cada accionista dispõe na assembleia, quer pessoalmente, quer como procurador, contando que essa limitação se aplique igualmente a todos os accionistas a quem pertença o mesmo número de acções e sem distinção de categoria; a limitação não vale em relação aos votos que pertençam ao estado ou a entidades para o efeito a ele equiparadas, e não vale também para o cálculo de uma maioria de capital exigida por lei ou pelos estatutos, salvo quando estes disponham diferentemente.

§ 4.º Não obstante cláusula contratual diversa, estipulada ao abrigo do parágrafo anterior, e com reserva da excepção constante da parte final do mesmo parágrafo, os privilégios de voto legalmente criados, qualquer que seja a forma que revistam, não podem ser exercidos na medida em que, por força deles, um accionista represente na assembleia mais da décima parte dos votos conferidos por todas as acções e mitidas.

Art. 2.º Nas sociedades constituídas antes da entrada em vigor do presente diploma continua a observar-se o preceituado na anterior redacção do § 3.º do artigo 183.º do Código Comercial, enquanto não for tomada deliberação que altere os estatutos no sentido de não haver limitações de números de votos, salvo a que derive da nova redacção do § 4.º do mesmo artigo, ou no de estabelecer as limitações permitidas pela redacção dada àquele § 3.º no artigo 1.º

Art. 3.º Nas sociedades constituídas antes da entrada em vigor do presente diploma, em que o Estado ou entidades para esse efeito a ele equiparadas beneficiavam da excepção prevista na parte final do § 3.º do artigo 183.º do Código Comercial, a deliberação referida no artigo anterior só pode ser tomada com os votos concordantes do estado ou de tais entidades.

Divergências entre sócios com igual poder de voto

Art. 4.º Podem ser requeridas as providências a que se referem os artigos seguintes quando, em duas reuniões da assembleias geral distanciadas entre si pelo menos sessenta dias, nas quais hajam participado todos os sócios com direito de voto ou, devidamente convocados, sócios que representem um mínimo de 90 por cento do capital social, não puderam ser tomadas, devido a Ter-se verificado empate de votos, deliberações: De nomeação de administradores ou de gerentes, desde que tomada necessária por força da lei ou dos estatutos:

b) De apreciação do balanço e contas