A redacção proposta pela Câmara é, pois, a seguinte
É permitida a transplantação, exclusivamente para fins terapêuticos, de tecidos ou órgãos do corpo humano, a partir de pessoa viva, desde que não seja contrária à moral ou aos bons costumes.
No n.º 1 limita-se a licitude das transplantações aos casos em que estas sejam necessárias à sobrevivência do receptor, do mesmo modo se exigindo que as suas possibilidades de sobrevivência sobrelevem o risco corrido pelo dador.
Isto é exacto e compreensível, mas talvez se possa ir mais longe, sem atraiçoar a noção de rigidez que o preceito inculca, abrindo um pouco a hipótese, até pelas dificuldades médico-técnicas de ajuizar com segurança a fronteira da sobrevivência humana à face da doença. E também porque não se justifica o menosprezo pela oportunidade de importante alívio ou atenuação do sofrimento físico.
Sugere-se, assim, que na alínea a) do preceito a expressão «sobrevivência» seja substituída por esta outra «indiscutível e fundamental valor terapêutico».
De igual modo, na alínea c) em vez de «sobrevivência», será de referir a probabilidade de simples «sucesso da operação».
Também se considera importante completar a condição da alínea b) - que só abrange o risco de morte do dador ou a sua sensível diminuição física - com uma referência expressa à inexistência de riscos para a sua própria personalidade moral, desta forma se evidenciando que também os valores éticos estão em causa.
No n.º 2 do artigo define-se o conceito de «sensível diminuição física», na determinação dos riscos em que o dador não deverá incorrer. A Câmara entende que a noção poderá ser alargada, fazendo-se realçar, como pressuposto condicionante da ablação do órgão, a necessidade de o dador se encontrar num estado geral de saúde compatível com a operação a realizar.
A nova redacção do preceito, será, pois, a seguinte:
b) O dador não corre um risco anormal de perecer, de lhe ser causada uma sensível diminuição física, ou de ser afectada a sua personalidade moral,
c) As probabilidades de sucesso da operação sobrelevam indubitavelmente o risco corrido pelo dador
No entanto, verifica-se que a tendência das legislações estrangeiras é para aumentar aquele limite de idade, quando não se exige pura e simplesmente a maioridade legal.
Filiar-se-ão tais tendências em razões de falta de maturidade psíquica de um menor de 14 ou 16 anos quando chamado a intervir decisivamente em circunstâncias tão dramáticas para si e sua família, em que a criação de um forte clima emocional poderá facilmente influenciá-lo ou sobre ele exercer insensível coacção.
A doutrina interroga-se também, manifestando dúvidas quanto à liberdade de consentimento de um menor que, de súbito convertido em anjo salvador, ao mesmo tempo mártir e herói, poderá estar momentaneamente imbuído de um sentimento de excessiva galhardia, conducente a atitudes precipitadas.
Julga-se ser mais fácil aceitar justificativas considerações desta natureza do que procurar defender, aliás com razões estritamente legais, atributivas de uma capacidade de exercício muito relativa, a tese da idade dos 16 anos como bastante na prestação de consentimento para a recolha de um órgão vital do próprio corpo.
Por isso a Câmara se inclina, não também sem hesitações, para a idade mínima de 18 anos, situando-se na mediana das várias soluções encontradas na legislação estrangeira.
Ainda quanto ao problema da autorização da recolha e doação de um órgão ou tecido, para efeitos de transplantação, será de acentuar no preceito o condicionalismo da necessidade de uma plena capacidade volitiva e de uma pessoal, consciente e esclarecida liberdade na prestação do consentimento.
A redacção do preceito, tal como a Câmara o propõe, é a seguinte:
Só poderão ser dadores indivíduos com mais de 18 anos que tenham plena capacidade volitiva e possam manifestar um pessoal, livre e esclarecido consentimento.