um adoptava 5 milhas, outro 9 milhas, outro 10 milhas, outro 200 milhas, e um, 50 km.
Mais uma vez, por desentendimento acerca do direito de pesca, a Conferência teve de encerrar sem haver sido obtido acordo quanto ao ponto fundamental que provocara a sua convocação a largura do mar territorial.
É, todavia, curioso registar que, tendo as duas últimas guerras mundiais demonstrado a dificuldade, para os Estados não envolvidos, de defenderem eficazmente a neutralidade nas suas águas para além de 8 milhas (52), se notou de então para cá um crescente número de países dispostos a alargar para além desse limite o seu mar territorial (53).
O facto representa, muito provavelmente, "uma fonte potencial de dificuldades futuras" (54).
Mas uma coisa, desde já, parece indicar como certa menos do que em 1930 se entrevê hoje que esteja próximo o momento em que será possível estabelecer uma regra uniforme sobre a largura do mar territorial - quer por via convencional, quer por espontâneo consenso dos Estados.
Gama Barros, lembrando que a "pirataria era um dos maiores inimigos com que tinha de lutar geralmente o comércio marítimo durante a Idade Média", aponta os acordos estabelecidos com outros países, os privilégios concedidos a mercadores estrangeiros e as medidas a partir do século XIII tomadas para enfrentar o flagelo, repetidamente denunciado em cortes (55).
Neste ponto, as nossas dificuldades não diferiam das que tinham de enfrentar as restantes nações europeias, atlânticas ou mediterrânicas.
A "opiniom de Bartholo", que não existindo lei do Reino as Ordenações mandavam que em última análise fosse guardada (56), era já conhecida e seguida no reinado de D. João I.
Sem embargo, nas pazes com Castela, concluídas em Medina del Campo a 31 de Outubro de 1431 e ratificadas pelo rei em Almeirim a 27i de Janeiro de 1432, na companhia de seu filhos, ficou capitulado "que dos lugares donde em huu rreyno sooem ser ancorados navyos ataa hua legoa, nom possam ser tomados por naturaes e sobdictos do outro rreyno, em todollos portos e abras e quebradas e ancorações de cada huu dos dictos rreynos e senhorios" (57).
A distância de uma légua, que a aproximação com outros textos leva a pensar teria o mesmo valor que ainda hoje é atribuído a essa medida no nosso país(58), tomava o lugar das 100 milhas, propostas por Bártolo. Por necessidade de negociação, ou por corresponder a costume enraizado?
A destrinça poderia ter interesse quanto ao Atlântico Norte. Mas não em relação ao Atlântico Sul, onde desde o início praticávamos de maneira sistemática a política do mare clausum.
Daí em diante, invocando como título primordial a concessão pontifícia ("esguardando nos em como os samtos padres de Roma nos teem feita merçee e doaçom") e juntando-lhe o bom uso dela "com grades gastos e perijgos e despesas", como no intróito de outra lei sua, esta de 31 de Agosto de 1474 (59), se exprime o monarca, arrogam-se os nossos reis o domínio dos mares e acrescentam aos seus títulos os "ditados" de senhores do comércio, navegação e conquista dos novos mares e das novas terras descobertas.
As Ordenações decretam proibições formais e fulminam com severas penas quantos tentem turbar este monopólio ou vão sem licença régia à "Guinee, e Índias, e quaisquer outras Terras e Mares, e lugares de nossa Conquista" (60) Leis extravagantes, como a de 9 de Fevereiro de 1591 ou a de 18 de Março de 1605 (61), reproduzem ou reforçam, quando não ampliam, estas disposições.
A doutrina do monopólio da navegação e comércio no Atlântico Sul e no Indico é, desde os derradeiros anos do século XVI, vigorosamente apoiada por jurisconsultos como António da Gama (62), Jorge Cabedo de Vasconcelos (63) ou Bento Gil (64).
Em 1608, pouco antes de publicada a obra de Bento Gil, saía anònimamente a lume o opúsculo já referido de Grócio, Mare Liberum.
Morto entretanto Bento Gil, tomaria sobre si o encargo de defender os direitos da coroa de Portugal Fr. Serafim de Freitas, com o De Justo Imperio Lusitanorum Asiático (65).
A argumentação de Serafim de Freitas será alargada por Domingos Antunes Portugal, que não descura a tradição bartolista.
Tandem jacit, quod mara dicitur de territorio illius civitatis cui appropinquat [ ] quia mare dicitur esse de territorio Principis, cujus provincis adhaerat
(52) Cf v g, Balladore Pallieri, "Un problema sempre insoluto l'estensione del mare territoriale", em D. Internas , vol. XIII (1959), p. 130.
(53) Cf Boaretto, "Mare", em Novíssimo Dig Ital, vol X (1964), p. 262.
(54) Brierly, op. cit. - Na tradução portuguesa p. 208
(55) História da Administração Publica em Portugal , Lisboa (2.ª edição dirigida pelo Prof. Torquato de Sousa Soares, e d ), t x, pp. 221 e segs e 333 e segs.
(56) Ordenações Afonsinas, livro II, t IX, § 2; Ordenações Manuelinas, livro II, t v, § 1, Ordenações Filipinas, livro III, t LXIV, § 1.
(57) Capítulo 12, que no texto castelhano corresponde ao cap. 18 em Monumenta Henricina, Coimbra (1962), v. IV, p. 18 e segs.
(58) Cf v g., a Crónica, do D. João I, em cujo cap. CXXXI-A Fernão Lopes refere a chegada da frota portuguesa a Cascais, "lugar que eram cinco léguas da cidade", o que condiz com a atribuição de tal valor.
No mesmo sentido se pronunciava Gama Barros, op. cit. t X, p. 87.
(59) Reproduzida pelo Prof. Paulo Merês, op. e loc cits., pp. 43-45.
(60) Ordenações Manuelinas, liv. V, t, 109, Cf tt 81 e 113 (na ed. de 1521, o t. 109 tem a numeração de 112) Ordenações Filipinas, liv V, t 107 Cf tt 106 e 108.
(61) Ambas nas Ordenações "Vicentinas" (1747), vol. V, e a segunda tb em Andrade e Silva, Collecção Chronologica da Legislação Portuguesa, Lisboa (1854), anos de 1603-1612, p. 108.
(62) Dicisionum Suprems Senatus Invictissimae Lusitaniae Regis, Lisboa (1578), Dec CCCXXXV.
(64) Commentaria in lex Hoc Jure..., Coimbra (1609), parte I, cap. III, §§ 15-34.
(65) Valhadolid (1625). Há tradução de M. Pinto de Meneses, com introdução do Prof. Marcelo Caetano, Lisboa (1959), vol I