O projecto de lei admite, como vimos, a solução do recurso subordinado, mas, contraditoriamente com os princípios que disciplinam esta espécie de impugnação58, afirma que, "interposto recurso subordinado pela acusação, tudo se passa como se a mesma acusação tivesse recorrido da decisão antes da defesa" (o sublinhado é nosso).
Quer dizer o recurso subordinado actua como recurso principal ou independente, e, por isso, o tribunal superior conhecerá da causa, muito embora o réu queira desistir.
Repare-se que é esta também a orientação do direito italiano o recurso "incidental" do Ministério Público mantém eficácia, não obstante a renúncia posterior do réu ao seu próprio recurso (artigo 515, n.º 3, in fine, do Código de Processo Penal italiano) E foi nesta orientação que certamente se inspirou o projecto de lei.
Embora com alguma hesitação, crê-se que não afecta gravemente a segurança jurídica admitir a orientação contrária - inteira eficácia da desistência do réu do seu recurso, justamente como hoje sucede - e, desta forma, é possível oferecer uma solução mais liberal que a do direito italiano.
Por isso, compreende-se que a lei lhe dê a faculdade de recorrer de quaisquer decisões, ainda que o recurso seja interposto no exclusivo interesse da defesa (n.º 1.º do artigo 647.º do Código de Processo Penal).
Sendo assim, não pode deixai de se aceitar a proibição da reformatio in pejus sempre que o Ministério Público recorra por entender que a decisão é prejudicial ao réu, em casos, por conseguinte, em que entenda ter havido errada aplicação da lei, por forma a afectar a liberdade daquele, que também lhe cumpre defender.
Se assim proceder, parece que, dentro dos princípios informadores da proibição da reformatio, não poderá pedir, em recurso que interponha para o Supremo, uma
agravação que ultrapasse os termos daquela condenação, salvo evidentemente quando for caso de qualificação diversa dos factos, a que acima nos referimos.
Esta solução, que poderá deduzir-se dos princípios, parece merecer, contudo, expressa consagração legislativa, e, por isso, ela ficará a constar do § 3.º do articulado sugerido por esta Câmara59
Nestes termos, se o assistente recorre, pedindo a agravação da pena, fica desde logo excluída a proibição da reformatio, como é óbvio. Mas Terá de interpor recurso principal, de harmonia com as considerações feitas acima (n.º 25).
Entende-se ainda que o regime proposto no número anterior (n.º 29) quanto ao recurso do Ministério Público para o Supremo deve aplicar-se igualmente, por idênticas razões, ao recurso a interpor pelo assistente para o mesmo Tribunal.
2.º Quando o representante do Ministério Público Junto da Relação, ou junto do Supremo Tribunal de Justiça nos casos em que o recurso sobe directamente da 1.ª instância a este tribunal, no visto inicial do processo, expressamente se pronunciar no sentido de que deve ser agravada a pena.
Neste caso, deve ser notificado o recorrente para responder, no prazo de oito dias.
§ 2.º O disposto neste artigo e no n.º 1a .º do parágrafo anterior aplica-se igualmente quando o Ministério Publico interponha recurso em beneficio exclusivo do réu.
§ 3.º Quando o representante do Ministério Publico junto da Relação ou o assistente se tenham conformado com a condenação imposta na 1.ª instância, não poderão pedir, em recurso que interponham para o Supremo Tribunal de Justiça, uma agravação que ultrapasse os termos daquela condenação, salvo quando for caso de qualificação diversa dos factos, consoante o disposto no n.º 1.º do § 1.º
Tanto pela redacção que agora se sugere para o artigo 667.º, como pela proposta no projecto de lei, fica eliminada a primeira parte dessa disposição, onde se diz. Quando um tribunal de provimento ao recurso interposto de um despacho de pronúncia ou equivalente poderá alterar a incriminação, nos termos dos artigos 447.º e 448.º
58 O recurso subordinado tem a sua vitalidade e razão de ser necessariamente presa e condicionada à vitalidade do recurso principal, pelo que, se este naufragar, por qualquer razão (o recorrente desiste, por ex. ), caduca o recurso subordinado (cf Prof. A. Reis, Código de Processo Civil Anatado, V, p. 289)
59 O silencio da lei quanto a este ponto poderia conduzir a dúvidas, dados os termos amplos de permissão do recurso do Ministério Público em processo penal (cf o artigo 647.º, n.º 1 e § 2.º, do Código de Processo Penal)