O Sr. Armando logres (PS):

A Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias resolveu designar uma subcomissão para se pronunciar sobre o projecto de lei n.º 46/I, a fim de habilitar aquela a melhor decidir sobre o texto na sua segunda versão.

A subcomissão reuniu em 8 e 20 de Junho de 1977, tendo apreciado o problema das incapacidades cívicas constante do projecto em epígrafe apresentado pelo Partido Socialista.

Dessa apreciação surgiram duas posições antagónicas. O Partido Socialista e o Partido Comunista Português aceitaram inteiramente os termos do projecto; o Partido Social-Democrata e o Centro Democrático Social rejeitamento completamente.

Assim, o CDS sustentou haver oposição entre o teor do projecto e o disposto no artigo 310.º da Constituição da República, por considerar que a aplicação das medidas propostas no projecto implicam novos saneamentos, quando o artigo 310.º proíbe a abertura de novos processos daquela natureza depois da posse do Presidente da República eleito nos termos da Constituição.

Sustentou ainda que a interpretação do artigo 308.º da Constituição deve ter em conta o disposto no artigo 310.º seguinte.

O PSD rejeitou o projecto porque, no seu entender:

1.º Ele não se coaduna com o texto nem com o espírito do preceituado no artigo 310.º da Constituição, pois conduz, sem mais, à abertura de autênticos novos processos de saneamento, nos quais serão mesmo abrangidos os casos já julgados nos processos que correram termos ao abrigo da legislação anterior sobre saneamento da função pública, legislação essa que caducou já em 31 de Dezembro de 1976;

2.º O artigo 308.º, como resulta dos seus próprios termos e da expressa remissão para o Decreto-Lei n.º 621-B/74, de 15 de Novembro, não carece de regulamentação, pois é um preceito constitucional de aplicação directa;

3.º O projecto em causa, proposto há mais de um ano após a promulgação da Constituição, se vier a ser aprovado, criará situações de injustiça e de instabilidade que não contribuirão para a desejada consolidação da democracia.

O Partido Socialista entendeu que o projecto é correcto e não ofende a Constituição. Antes, pelo contrário, visa desenvolver, por lei ordinária, o preceito do artigo 308.º da Constituição, já que este, tendo embora considerado nos seus n.ºs 3 e 4 as consequências das incapacidades eleitorais passivas, não considerou as consequências das .incapacidades eleitorais activas, indubitavelmente mais graves do que as passivas.

Efectivamente, não poder ser eleitor é incapacidade bem mais grave do que não poder ser eleito, mas poder ser eleitor.

Ora, quem está proibido constitucionalmente de ser eleitor carece, nessa medida, de direitos políticos.

Sucede que todo o nosso sistema legislativo é no sentido de: impedir que quem não está no gozo pleno dos seus direitos civis e políticos exerça funções públicas enquanto durar essa privação dos seus direitos.

Deste modo, o projecto apresentado, que nada tem que ver com os saneamentos encarados no artigo 310.º, limita-se a tirar da privação dos direitos políticos dos indivíduos indicados no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 621-B/74 as consequências normais que o sistema legislativo português impõe.

O Partido Comunista Português concordou com a tese sustentada pelo Partido Socialista.

Na sua reunião de 21 de Junho, a Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, rendo em conta o relatório da subcomissão designada, deliberou aprovar aquele texto, emitindo parecer favorável ao texto proposto por maioria 9 votos contra do PSD e do CDS e 11 votos a favor do PS e do que àquela comissão parlamentar essencialmente incumbe defender.

Nem releva que possa. dizer-se poderem ser poucos os casos que virão a ficar sob a alçada de uma tal lei, e isto porque o que importa é curar de saber se ela, genérica e abstractamente ofende ou não direitos e garantias do cidadão consagrados nos normativos constitucionais que regem a vida democrática da nova sociedade portuguesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A esta luz, os elementos do PSD naquela comissão parlamentar tinham de votar, como votaram, pela rejeição do aludido projecto de lei, uma vez que o mesmo viola, desde logo, e frontalmente, os artigos 308.º e 310.º da Constituição, além de outros que adiante se referirão ainda.

Confirmando o expressado já na Comissão, e incluído no relatório que acaba de ser presente a esta Câmara, algumas considerações mais se nos impõe desenvolver.