Vozes da UEDS, do PS e da ASDI: - Muito bem!

O Orador: - Mas se não vos pergunto o porquê do vosso não à amnistia, o porquê do vosso não à justiça, julgo ter o direito de esperar de vós uma resposta clara a esta outra interrogação: em nome de quê é possível recusar o perdão quando estão em causa vidas humanas?

Em 1976 o deputado constituinte Barbosa de Melo saudava, em nome do PSD (então PPD), a aprovação do artigo 25.º da Constituição, que consagrava a inviolabilidade da vida humana e a inexistência -em qualquer caso- da pena de morte, nestes termos: «somos o País que deu a Vítor Hugo a inspiração para as suas belas e profundas palavras sobre o sem sentido da pena de morte quando em 1867 essa pena se aboliu para todos os delitos. Esta Assembleia Constituinte, ao proclamar hoje solenemente que ninguém poderá, em nome da lei, impor a morte a alguém, afirma solenemente o absurdo que é a aplicação da pena de morte a pretexto de retribuir um crime cometido, ou a pretexto de intimidar os outros que possam vir a cometer

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!

como lhes chamou Morvam Lebes que, os asilos que a sociedade reservava aos seus próprios inimigos, a oportunidade concedida em nome da dúvida quanto a todas as leis, mesmo as mais rigorosas, mesmo as julgadas mais justas. Hoje parece bastar que se proclame a justeza dos objectivos, a bondade dos propósitos, para se encontrar a tranquilidade de quem não duvida da justeza dos seus actos. É ainda, e sempre, os fins a justificarem os meios.

Só que, para continuarmos citando Lebesque, «os fins são como belas damas que raramente vêm ao rendez-vous, enquanto os meios, seus escravos, estão sempre presentes, tirânicos e pontuais.» O que se vos pede, senhores deputados da maioria, o que se vos pede aqui e agora, não é que renuncieis aos vossos objectivos, se os proclamais belos e justos ficais com eles. O que se vos pede é algo de bem mais simples, mas porventura, bem mais difícil, é que, por uma vez, a vossa atitude concreta, perante a situação imediata e real com que vos defrontais, não seja a demonstração da hipocrisia dos vossos propósitos. Se vos declarais defensores e arautos de uma sociedade futura melhor e mais justa, será demasiado pedir-vos que não torneis impossível que a sociedade presente seja, ainda que por um momento, mais fraterna e tolerante?

O Sr. Presidente: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Alguns acharão nas minhas palavras, no meu apelo, na esperança que apesar de tudo o acompanha, só uma prova mais de incrível ingenuidade.

Em nome da única certeza que é a de não haver certezas absolutas, quero guardar a esperança de que o resultado deste debate se traduzirá num claro grito de «Viva a Vida!» e não no envergonhado e mudo repetir pela maioria dos deputados da AD do sinistro «Viva la Muertel», de Malan Astray.

Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma palavra de solidariedade para com os que na prisão continuam a luta com a única arma que lhes resta: a sua própria vida. Ideologicamente deles tudo ou quase tudo me separa. Deles me aproxima uma solidariedade sem reticências que em mim, nos meus camaradas do grupo parlamentar, nos meus camaradas de partido encontrarão sempre todos os que são vítimas da injustiça, do arbítrio, da opressão, sejam quais forem as máscaras por detrás das quais a injustiça, o arbítrio e a opressão se acobertem.

Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da deputada Natália Correia (PSD).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Valentim de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subscritores que somos de ambos os projectos hoje submetidos à Assembleia da República, é evidente que votaremos a favor deles.

Fazemo-lo, essencialmente, por razões que já nos haviam determinado a subscrever o projecto de lei n.º 319/82, relativo à amnistia de crimes de fim exclusiva ou predominantemente políticos, ou seja, em termos da solidariedade que nos liga a todos os homens, independentemente de serem diferentes e até divergentes as nossas opções ideológicas. E também porque, tendo consciência da relatividade da parcela de verdade que julgamos possuir, reconhecemos, de igual modo, que o mundo não pertence apenas ao direito e que a tolerância não é menor valor que a justiça.