Declaração de voto enviada para a Mesa e relativa a matéria votada na sessão n.º 113, realizada em 2/7/82

(Avocação da votação da proposta de lei n.º 81/II)

Sr. Presidente, Srs. Deputados,

A votação contra o requerimento apresentado pelo PCP impediu que aqui, com transparência, se discutissem alguns dos marcos fundamentais da burla eleitoral da AD.

A maioria parlamentar da AD melhor dizendo a representação ministerial que aqui se senta- não poderia esconder através de uma discussão na especialidade em plenário, os seus verdadeiros objectivos: o voto pela arreata tendo como componentes as limitações à liberdade de propaganda, a partidarização da vida local, as normas com destinatário certo - a APU.

Recusou-se aqui a possibilidade de aperfeiçoar um diploma, de o atacar nos seus aspectos mais graves, reduzindo a inércia à vontade conspirativa da AD, desnudando-a perante o país.

Ficou bem claro que a AD pretende a continuação da chapelada agora a coberto de uma pretensa legalidade.

A solução saída do Ministério Ângelo Correia quanto ao voto por correspondência era de tal modo uma intentona grosseira contra a honestidade reclamada por qualquer acto eleitoral, que nem os próprios deputados da representação ministerial puderam persistir na proposta inicial.

Os votos deixaram agora de viajar pelo correio.

Mas continua a não se garantir o sigilo e a personalidade do voto quando se permite que uma mesa de recolha de votos vá a enfermarias de hospitais, asilos e outros estabelecimentos de assistência, e assista ao voto ombro a ombro.

A AD quer permitir o voto de doentes internados, mesmo no próprio local do internamento, porque espera jogar com a extrema situação de dependência em que o doente se encontra.

A AD quer o voto dos presos do próprio local de reclusão por que quer jogar com a pressão que o ambiente prisional sempre exerce. Acena-se-lhes com as saídas precárias, o parecer favorável para uma liberdade condicional.

O texto aprovado na Comissão não garante, na verdade o segredo e a pessoalidade do voto.

É certo que a AD cedeu na procura de um consenso maioritário, mas nunca renunciou a uma margem confortável de lucro.

E tudo é lucro quando se consegue a proibição de propaganda gráfica ou sonora porque se cala a voz e a palavra e sobretudo porque também se cala a Constituição da República - tudo é ganho quando a escassos meses das eleições com listas para os órgãos autárquicos em adiantada fase de preparação, se exige a indicação expressa dos partidos que propõem cada candidato mesmo que se trate de candidato independente.

Assim se procura obstruir aquela coligação que maior número de candidatos independentes apresenta nas suas listas.

A proposta de lei é de facto um diploma declaradamente anti-APU. Como bem o revela o n.º 2 do artigo 47.º.

Ao inviabilizar-se a discussão transparente e clara que queríamos trazer a este plenário ficou bem evidente que se procura calar o povo, desvirtuando o sentido do seu voto.

Não admira. O Governo não reconhece o povo. E porque o não reconhece recusa-lhe a liberdade de um poder local forte.

O Governo não reconhece o povo, logo deve e tem de cair.

A Deputada do PCP, Maria Odete dos Santos.