função, a uma luz jusnaturalista, despenalizando-o, do que mantendo-o fulminado com sanções penais.

Vozes do PS: - Muito bem!

cialistas que o agostinianismo e, mais tarde, Suarez, Descartes ou Wolf perfilharam.

Não creio, portanto, que a simples invocação de uma essência humana potencial releve para estabelecer o quadro de premissas com vista à decisão do problema.

Esse quadro deve ser outro, em que não se tenham prevalentemente em conta as respostas tradicionais - que são. aliás, desfavoráveis à personalização do nascituro -, mas sim se leve em consideração, sobretudo, a informação que a modernidade trouxe às ciências biológica e sociológica.

Será à luz desses dados informativos que haverá que optar, na dúvida laica, sobre se o aborto provocado deve continuar criminalizado.

Num prato da balança estará o precedente de países que são exemplo de respeito pelos direitos humanos e, mesmo assim, consentem, dentro de certos limites, a interrupção voluntária da gravidez, argumento que não é despiciendo, tanto mais quanto, em matéria de defesa dos direitos humanos. Portugal não foi, duran te 48 anos, um modelo a seguir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Protegeram-se os fetos, mas desprotegeram-se os homens. E muitos dos que agora protegem aqueles, calaram-se quando estes eram desprotegidos.

Aplausos do PPM, do PSD, do PS, do CDS, da ASDI e da UEDS.

No mesmo prato da balança se deve ponderar toda a realidade social existente, nomeadamente a consciência pouco generalizada da repugnância do aborto provocado, patente no facto que se julga seguro de ele ser praticado impunemente por pessoas que não correspondem à noção corrente de «criminosos», em número de várias dezenas de milhar por ano. E assim será de ponderar o número de situações de desespero ou de grande pressão cultural, social e económica, que conduz, na prática, à interrupção voluntária da gravidez.

Porém, no outro prato da balança está, não já o medo conservantista ao uso do progresso, ou a resistência por espírito de reacção, à abertura de problemas que perturbam a fixidez de doutrinas inseguras, mas tão só uma realidade pequena, embora valiosa, que é o feto resultante da junção de células de um homem e de uma mulher.

Está aí um ente vivo dotado de perseidade, ainda que minúsculo, mas já visto e analisado abundantemente pelo microscópio da ciência humana. Não menos real por ser pequeno ou por estar escondido; não menos vivo por dar poucos sinais de si; não menos humano por não ter a forma aparente da maior parte dos entes humanos; não menos perfeito por ser dotado apenas de órgãos embrionários ou de uma simples estrutura genética que, no entanto, tem estabilidade e determina mesmo toda a sua evolução.

E certo que o nascimento é um salto qualitativo para a vida desse ente que o atira para o mundo convencional. Mas eleja foi atirado para o mundo. Já existe, em acto. E já apresenta, segundo revela a ciência moderna, grande parte das características que levam as sociedades a proteger, de uma forma vigorosa e especial, a flecha da criação como sede de direitos sacralizados.

É lógico, pois, que, pelo menos à cautela e ainda com menor gravidade, se trate repressivamente, na ordem jurídica, a liquidação da vida desse ente. A licitude dessa liquidação levaria, provavelmente, ao aumento de casos de aborto provocado. E com isso, pioraria a comunidade portuguesa.

Não é uma questão de desconfiança na capacidade da humanidade para modelar a natureza segundo a razão. É a confiança nessa mesma razão, não para reprimir universal e cegamente, não para fulminar, por sistema. infractores ao código, não para impor modelos rígidos e severos de ordenamento social, mas sim para. abastecida pelas aquisições da ciência, reconhecendo a natureza humana, ainda que não totalmente perfeita, do nascituro, proteger a própria humanidade. E para, em consequência, não prestar consentimento passivo ao ataque, posto que menos patente à vista desarmada, extintivo da vida dessa fonte de valores.

Por tudo isso, tudo visto e ponderado, após meditação serena, me decidi a votar, como vou fazer, contra o projecto de lei n.º 309/II. A votação favorável, nas circunstâncias em que nos situamos, a meu ver, contribuiria menos para a melhoria da sociedade portuguesa, do que a manutenção do aborto provocado na zona do ilícito penal.

Aplausos do PPM, do PSD, do CDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.