O Orador: - Serão todos inautênticos defensores ou comunistas encapotados? Não sei! O seu partido é um pouco estranho nessas coisas.

Em todo o caso, Sr. Deputado, a autenticidade mede-se pelos factos e também pelos argumentos. Os argumentos que o Sr. Deputado utilizou agora são de um primarismo verdadeiramente chocante - desculpe que lhe diga- de uma franqueza insólita. Raras vezes terei ouvido coisas deste ripo. Isto, porque vir dizer que a Declaração Universal dos Direitos do Homem legitima a consagração legal de coisas destas é utilizar essa Declaração, que foi bandeira de luta -mesmo em Portugal, como se deve lembrar- contra abusos e prepotências, para legitimar agora buscas, escutas, abusos e prepotências. Isto é um uso totalmente subvertido e invertido da Declaração Universal dos Direitos do Homem, e essa lógica recusamo-la.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do Sr Deputado António Gonzalez (Indep.).

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria protestar contra aquilo que considero uma profunda hipocrisia do PCP, expressa pela voz do Sr. Deputado Tose Magalhães.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Efectivamente, vêm defender nesta Assembleia aquilo que noutros sítios atacam.

Vozes do PCP: - Onde?

O Orador: - Entendem que devem ser respeitados, quando não são violados, aquilo que noutros pontos entendem que, pelo contrário, está certo. Refiro-me, concretamente, à Polónia, à União Soviética, a todos esses países.

Vozes do PCP: -Ah!... )á cá faltava!

O Orador: - E se me permitem um desabafo e usando uma linguagem policial que está de acordo, isto recorda-me o caso do hipócrita vegetariano:

Andam cá fora a anunciar as delícias da carne de peixe, mas lá em casa só comem hortaliça.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É muito esperto!

O Sr. Presidente: - Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Correia Afonso, aquilo que acaba de dizer evoca-me a famosa história do primo Henrique: o primo Henrique, apanhado com a mão no pote do mel, olhou à volta e disse:

Apanhaste-me, mas eu vi a tua prima com o Alfredo. Portanto, cala-te, não digas nada.

Não nos apanhará nessa posição. O Governo tem ali uma proposta que está eivada de inconstitucionalidades; não há fundamento nenhum para essa proposta, nem interno nem internacional. O Sr. Deputado não fará de primo Henrique nesta Assembleia, e se fizer é consigo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, suscita, nesta fase, um ou outro pedido de esclarecimento. E digo «nesta fase», fase que é, manifestamente, a da...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não gagueje, Sr. Deputado!

O Orador: - Peço ao Sr. Presidente que me desconte este tempo de interrupção.

Mas essa critica ao modo de gaguejar, de não gaguejar, essa crítica de carácter estético, traz-me à mente, enfim, uma certa preocupação do Sr. Deputado para a repressão. Até os estilos de falar o Sr. Deputado quer reprimir?! Modere a sua capacidade de repressão! Eu falo com a minha voz; gaga, com sotaque, sem sotaque, é a voz com que aprendi a falar, mas esta voz há-de ouvir-se com liberdade.

Aplausos do PSD.

Guarde os seus cânones de realismo socialista!

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado, ainda não chegou o tempo de reprimir! Deixe-me gaguejar à vontade, deixe-me ser livre a gaguejar!...

O Sr. Carlos Brito (PCP): -Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado, eu dou-lhe toda a liberdade de gaguejar, aliás devo sublinhar que gagueja muito bem ...

Mas só queria sublinhar que o Sr. Deputado está embaraçado, e talvez algumas dores de consciência tenha.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mais uma vez peço ao Sr. Presidente que me desconte este tempo de interrupção. E mais uma vez a sua intervenção é sintomática. O Sr. Deputado não faz crítica às palavras e ao que se diz, mas à personalidade, ao indivíduo. É um juízo de personalidade dizer «está embaraçado».

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Vamos ver se não está!