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rei». Compreendo, Sr. Deputado, que doa a alguns esta realidade nova, que é o facto de a mulher ser igual em direitos, de assumir os seus direitos, de os exercer. Não estamos no século XIX, nem sequer no princípio do século XX. O Código Civil já não prevê a nomeação de um curador de ventre para proteger o feto contra a vontade terrível da mulher que quer conquistar a herança do marido por meios dúbios; já não temos esse Código Civil, mas outro, desde 1966. Mas há quem não esteja adaptado e há quem não só não esteja adaptado como também, nesta matéria, continue a preconizar soluções absolutas, que se radicam nessas concepções do século XIX, como o direito absoluto do feto à vida, contra tudo e todos, em todas as circunstâncias, seja o que for que aconteça à mulher, independentemente do seu destino, seja ou não exigível a continuação da gravidez. Esta teoria está há tantos anos ultrapassada que já no século XIX - como lembrava ontem, embora mal, um senhor deputado do CDS, que hoje também está calado - um grande jurista português defendia a despenalização do aborto terapêutico. O Sr. Deputado Malato Correia ainda está nessa altura, mas do outro lado.
Risos do PCP.
Quanto às soluções equilibradas, o que procuramos é uma solução equilibrada. E o nosso projecto procura precisamente estabelecer essa solução equilibrada, dando à mulher o máximo de meios para uma informação global sobre a sua situação e problemas e meios para que no caso de chegar, como último recurso, à conclusão de que deve interromper a gravidez o possa fazer com dignidade e com segurança, que é o mínimo que podemos dar às mulheres portuguesas, numa sociedade civilizada e desenvolvida, que é aquela que queremos ter.
Aplausos do PCP.
Concluindo, as soluções que o PSD propõe são de tal forma absolutizadoras, mistificam de tal forma os dados da ciência, que conduzem a soluções que, por toda a parte, o direito penal afasta. O direito penal não trata de forma igual a vida, nas suas diversas formas de evolução. 15to é um dado óbvio. O panfleto que leu diz o contrário, mas é um péssimo panfleto, é verdadeiramente um panfleto de pacotilha, sem a mínima base científica. Os cientistas são bastante mais modestos e menos dogmáticos do que isso e nós, juristas, legisladores, não podemos ser mais dogmáticos do que esses cientistas.
Compreendo perfeitamente a posição que assumiu, porque ontem propôs - é essa a sua concepção da mulher e da dignidade- que, além de se submeter a mulher às penas bárbaras a que está sujeito o aborto clandestino, ainda se submeta a mulher a uma outra, além da prisão eventual, que é a tal contemplação compulsiva do feto, que ontem o Sr. Deputado propunha como «meio edificante» para as mulheres portuguesas. Edificante para as mulheres portuguesas é reconhecer-lhes o direito de interromperem, quando tal for necessário, uma gravidez que não possam suportar. 15so é que é justo, isso é que é digno.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Malato Correia pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Malato Correia (PSD): - Eu desejava formular um protesto em relação ao pedido de esclarecimento que produzi, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, ouvi com atenção a intervenção que acaba de produzir, embora tenha sido lida um tanto apressadamente, o que provocou por vezes o escapar de algumas expressões. Mas creio que, a propósito da sua referência ao estado de necessidade desculpante, disse, com todo o à-vontade, que se o juiz desculpa, desculpa, se não desculpa, não desculpa. Eu quero protestar contra esta forma de expressão, que é manifestamente uma ofensa à maioria dos nossos magistrados judiciais, ...
Risos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, não abordei esse aspecto. O que eu