O Sr. José Magalhães (PCP): - Está cansado, mas não se vê porquê!

O Orador: - No fundo, sobre o planeamento familiar, Sr.ª Deputada Zita Seabra, o que nós não queremos é que o Estado aproprie a vida humana e a criação da vida humana, transformando este País num aviário de vida humana; o que nós não queremos é que seja o Estado a decidir sobre a vida e a fornecer pílulas para condicionar toda a vida. Não é esse o Estado que nós queremos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não há nem haverá um aviário humano em Portugal!

Aplausos do CDS.

O Sr. Deputado Lopes Cardoso pôs uma questão que, de algum modo, tem a ver com uma resposta já dada e que é a relativa à função da lei, o facto de a lei ser hipócrita, de a lei não aceitar a realidade, de a lei passar ao lado da realidade.

Em parte já discuti esta questão ao dizer que a função da lei, do meu ponto de vista, de um ponto de vista idealista, não é aceitar ou registar a realidade. As leis não servem para registar a realidade - servem para conduzir e normalizar a realidade.

É por isso que acho que a lei não é hipócrita; acho que a lei ainda não é cumprida, mas não acho que a lei seja hipócrita.

O Sr. Deputado Lopes Cardoso diz que muitas vezes o aborto é um mal necessário. Ora, ao falar de mal, reconhece implicitamente que ele não é um bem e que, portanto, não é uma opção cultural positiva da sociedade portuguesa.

O Sr. José Gama (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Neste ponto estou de acordo: o aborto é um mal necessário. Então o que digo é: não o transformemos num bem jurídico.

Aqui é que estou a querer evitar a hipocrisia, porque não se transforma um mal necessário num bem jurídico. 15so é que seria hipocrisia.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Muito bem!

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Sr. Deputado, peço-lhe imensa desculpa, mais já adoptei há pouco um critério e, embora com muito gosto o transgredisse, entendo que não o posso alterar.

Srs. Deputados, queria fazer apenas uma observação final. Posso garantir, se é que é preciso, que nada alterei, tanto na minha atitude como no meu comportamento político, em nenhuma circunstância, qualquer medida de comportamento. Assumi sempre a minha função porque, como diz alguém sobre o homem, ele é ele próprio e a sua circunstância. E eu tenho, naturalmente, uma circunstância partidária mais acentuada. Mas o que fiz foi responder a muita coisa que aqui tinha sido dita com violência e que não tomei como violência, mas com sentido de esperança.

E com este espírito que continuarei o meu combate e que o CDS continuará o seu combate.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pedroso.

O Sr. Eduardo Pedroso (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por citar 3 versos do poeta Mário Cesariny de Vasconcelos:

Despe-te de verdades

Das grandes primeiro que das pequenas Das tuas antes que de quaisquer outras.

Pergunto quantos nas questões essenciais da emancipação quotidiana do ser humano conseguem desembaraçar-se das suas verdades e das suas certezas, das verdades da conveniência e das certezas alheias à razão para poderem, sem máscaras nem preconceitos, olhar a realidade das coisas e a realidade das pessoas.

Quantos poderão libertar-se das verdades impostas e ajudar os seus semelhantes nos grandes passos necessários, para um humanismo vertical, livre e digno?

A questão do aborto, onde a limpidez das ideias, a depuração das palavras, o afastamento dos véus de mistificação, são essencial requisito da dignidade do debate, dignidade que é exigência absoluta, esta questão, pela sua própria natureza, e das suas implicações humanas, no psíquico e no físico, implicações religiosas, sociais, atrai vagas sucessivas de verdades impostas, mas também serve de bandeira de combates retrógrados, de arma política de circunstância, de motivo de calúnias e de mistificação.

E isto é tanto mais grave quanto a questão mergulha no mais fundo da sensibilidade humana, no mistério da continuação da espécie em contraponto com alguns dos dramas mais duros da vida em sociedade.

E no entanto já não se trata de despenalizar, ou descriminalizar, o aborto. O aborto hoje, e desde há muito, em Portug aborto e em 6 anos só pune 15 réus, 15 em muitas centenas de milhares, e mesmo assim 8 são homens.