4 - Com a criação do juiz de instrução visa-se defender eficazmente a liberdade pessoal, consagrada no artigo 9.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que diz: «Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.»

E consagrada também no artigo 15.º do título n da presente Constituição (parte que já está aprovada por esta Assembleia. Quando se diz: «Todo o cidadão tem direito à liberdade e à segurança. Ninguém pode ser privado da liberdade, a não ser . . .» , etc.). Portanto, essa liberdade pessoal ou individual já está consagrada nesta Constituição.

É que, como diz Salgado Zenha, em «A Constituição, o Juiz e a Liberdade Individual», na Seara Nova, Julho de 1972:

Julgar é verificar e valorar os factos (instruir) e aplicar o direito.

O acto jurisdicional final pressupõe uma actividade probatória anterior: esta prepara aquele. Tanto esta como aquele têm de estar a cargo de um juiz imparcial, não podendo estar a cargo do Ministério Público , que é parte subordinada ao Governo: portanto, é parcial. Sem instrução imparcial, não pode haver decisão imparcial.

A dificuldade na alteração das estruturas judiciárias, para dar cumprimento ao dispositivo constitucional proposto.

As actuais estruturas judiciárias não permitem, de repente, dar cumprimento a este preceito. Portanto, pode dizer-se que há dificuldade nessa alteração.

Tal dificuldade não pode ser óbice a que se consagre o único sistema que defende a liberdade pessoal.

De nada serve enunciar amplamente os direitos do cidadão se não se criarem os mecanismos permissivos da defesa desses direitos.

A existência de um preceito constitucional que cria o juiz de instrução obrigará a Assembleia Legislativa a legislar o mais depressa possível sobre a Organização Judiciária, matéria da sua competência, no nosso entender. (Esperamos que na rubrica « Os tribunais» venha a conseguir-se consenso nesse sentido.)

E obrigará o Governo a criar, posteriormente e o mais depressa possível, as estruturas possibilitadoras do cumprimento do referido preceito constitucional.

Aliás, o que acontece com este preceito, vai acontecer com muitos outros, ou com bastantes outros da Constituição que estamos a elaborar, os quais não são imediatamente exequíveis; supõem uma profunda alteração de certas estruturas.

A outra objecção que poderia fazer-se é a seguinte: Qual o papel do Ministério Público numa nova organização judiciária, uma vez que fica privado de competência instrutória.

Hoje, a competência instrutória compete predominantemente ao Ministério Público. Qual será o seu papel na nova organização judiciária?

Respondemos que o seu papel continuará a ser relevante e imprescindível:

a) Compete-lhe, como representante do Estado, deduzir a acusação, acompanhar os processos na fase do julgamento, interpor recursos, etc.,

b) Será, perante os tribunais, o representante do Estado, das autarquias locais, de órgãos estaduais ou para estaduais, nos termos a definir;

c) Será, perante os tribunais, o representante do s incapazes, etc.

Fica ainda um largo sector de competência e de intervenção do Ministério Público.

Tenho dito.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Antes de conceder a palavra ao Sr. Deputado que se encontra inscrito, comunico à Assembleia que o diploma prorrogando o funcionamento desta Assembleia já se encontra desde hoje na Imprensa Nacional.

Aplausos.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito brevemente, quero justificar a apresentação desta proposta de alteração. No que se refere ao funcionamento do juiz na instrução, há duas concepções:

O juiz da instrução que toma, em relação à instrução, determinadas funções, embora outras compitam a outras entidades, e o juiz instrutor.

A redacção do artigo 19.º, n.º 4, permitia confundir estes dois planos porque dizia: «será da competência de um juiz».

Agitação na sala.

O Sr. Presidente: - Quando for possível continuar com um mínimo de proveito para os trabalhos, eu continuo.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Então, portanto, chamo a atenção da Assembleia para que seja possível o Sr. Deputado continuar a sua intervenção.