Angola! Timor! Neste preciso momento em que vos falo sofrem ambos o que poderemos chamar as dores do parto. E que parto! Parto que gera milhares de filhos mortos!

Depois de cinco séculos triste herança deixamos: a guerra civil.

A guerra que uns tantos provocaram e outros lhe sofrem os efeitos mortais. É justo? Sinceramente, não sentis vergonha em presença de tais descolonizações?

Vergonha e amargura?

Eu, sim.

Caros portugueses que me escutais:

Com estas «independências» quem tem mais aproveitado, o colonizado ou o colonizador? Com estas «independências» quem mais é traída: a maioria africana ou a maioria europeia?

Quem aproveita, apesar de tudo, apesar das centenas de milhares de refugiados, é o colonizador ao libertar-se de obrigações acumuladas em séculos de presença.

Quem mais é traída é a maioria africana.

Portugueses: Porquê vos recordo tudo isto? Porquê tanto me empenhei em demonstrar, aqui nesta Assembleia, aquilo onde estou de acordo e aquilo onde não estou de acordo? Porquê, eu que tão pouco aqui tenho falado, hoje tanto tempo vos ocupei para vos falar de coisas que pertencem ao passado, quando, é certo, a presença de todos nós, nesta grande Sala, tem por objectivo a construção do futuro? Antes de tudo, cinco séculos e meio da vida de um povo merecem certamente a homenagem de todos os que aqui estamos, seja qual for o credo seguido. Depois, porque entendo ser meu dever, ser minha vantagem, neste processo que se desenvolve desde Abril do ano passado, deixar bem claro o meu entendimento, bem clara a minha posição quanto à independência da África que foi portuguesa.

Antes me quero vencido que enganado. Antes me quero verdadeiro que mentiroso.

Já que outra coisa não podemos ser na hora presente, sejamos corajosos. Sejamos corajosos no perder, como tantas vezes fomos corajosos no ganhar. A descolonização, que hoje atinge o seu ponto alto, não foi nem é uma descolonização exemplar.

Ela não foi sequer uma descolonização voluntária.

Ela foi tão-somente consequência de traição e derrota.

Vozes: - Não apoiado!

O Orador: - Já nada mais podemos fazer que salvar-nos da hipocrisia.

O Sr. Álvaro Órfão (PS): - O Jorge Jardim dizia o mesmo...

O Orador: - É porque é inteligente!

Nós saímos do ultramar porque não fomos capazes de permanecer no ultramar.

Esta é a verdade.

Contudo, podia ter sido outro o nosso proceder.

Podíamos ter sido grandes e generosos em lugar de covardes e mentirosos.

O Sr. Manuel Vieira (PS): - Não apoiado!

Vozes de protesto.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Isto não pode ser...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já há protestos como vê! O seu tempo está muito excedido. Tenho de lhe pedir o favor de concluir.

O Orador: - Tal como na África, aqui nesta Assembleia prefiro aceitar a derrota e continuar contra...

O Sr. Presidente: - Não se trata de derrota. Trata-se da lei.

Vozes: - Muito bem! Apoiado.

Aplausos.

Vozes: - Não apoiado!

Aplausos de alguns Srs. Deputados do CDS.

O Orador: - Confesso honestamente que não vim hoje a esta tribuna buscar o aplauso de ninguém, nem os favores de ninguém.

Vozes de protesto.