João Duarte, de 66 anos, dobra um lenço em triângulo e ata-o à cara, à laia de salteador, para mostrar a única forma de protecção dos operários que trabalhavam na CUF do Barreiro das substâncias tóxicas com que lidavam todos os dias. A empresa criada por Alfredo da Silva no início do século para a fabricação de adubos e de ácido sulfúrico fez questão de que os seus trabalhadores nunca a esquecessem. Entrou-lhes pulmões adentro para nunca mais sair. A morte dela, que se arrastou ao longo da década de 80, lançou toda uma comunidade no desemprego. "Quiseram matar o Barreiro porque tinham medo dele. E então mataram a CUF", sintetiza outro reformado.

Eram de força os operários Companhia União Fabril. Logo nos primeiros tempos da fábrica participam nas greves que se seguem à instauração da República, e nos anos subsequentes não deixam, como aconteceu noutros pontos do país, morrer o movimento sindicalista.

Obrigados a abandonar as fábricas, donde são colectivamente despedidos, no pico da agitação social contra o Governo no Verão quente de 1943, ocupam a linha férrea, gritando "Temos fome!", conta Fernando Rosas na História de Portugal dirigida por José Mattoso. Nesse dia formam-se vários cortejos de operários, com as mulheres à cabeça, que paralisam outras fábricas. A obra cita o relato de um deles: "O Barreiro viveu um período de verdadeira ocupação militar. A cavalaria carregava sobre os manifestantes. Fizeram-se centenas de prisões, indiscriminadamente. Entravam por um estabelecimento comercial as patrulhas da GNR; se por lá encontravam pessoas, por exemplo, a jogar às cartas à hora do trabalho, ia tudo preso, incluindo o comerciante. Prendiam mesmo pessoas que se limitavam a andar nas ruas, como presumíveis grevistas". O recolher obrigatório é instaurado a partir das 21h00.

"Era uma vida dura mas as pessoas tinham trabalho. Sentiam-se felizes", contrapõe João Duarte, que entrou nas fábricas no ano seguinte e fez de tudo um pouco, de transportar carvão, pirites e adubo até trabalhar nas caldeiras a vapor que davam vida às maquinarias. "Ainda hoje sinto os gases da fábrica dentro de mim. Engoli muitos", conta, com a tosse que se lhe escapa das entranhas a mostrar que não mente.

A CUF do Barreiro tinha-se tornado o primeiro complexo industrial do país. "O seu fundador, Alfredo da Silva, era um homem de visão empreendedora que sonhou fazer do Barreiro o centro de uma grande organização económica, com fábrica, estaleiros, laboratórios e oficinas, mas sem descurar os problemas sociais de protecção ao operariado na sua vida de família, na doença e na velhice", descreve o historiador Veríssimo Serrão. Aqui tinham emprego famílias inteiras. Quando chegava a idade de começar a trabalhar era à CUF que no Barreiro se ia dar o nome.

Fernando Rosas fala de como a CUF era, no final dos anos 30, um fenómeno à parte do ponto de vista económico, por se tratar "do único grupo monopolista industrial e financeiro já plenamente consolidado". Aos adubos e ao enxofre tinham-se juntado a construção naval, a metalurgia, os têxteis, os tabacos, os sabões e os óleos alimentares.

"Verificou-se não só a fusão do capital industrial com o bancário (a casa Totta, adquirida em 1921) mas a formulação e aplicação de uma clara estratégia de controle monopolista", defende Fernando Rosas. Até 1974 a CUF continuará a ser o principal grupo económico e financeiro de Portugal.

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