Discussão da revisão arrancou ontem em plenário Constituição à direita e à esquerda

São José Almeida Decididamente a Constituição portuguesa ainda é de esquerda. Esta a conclusão do início, ontem, da revisão em plenário. Um debate em que foi visível que o texto fundamental ainda não agrada ao PP. Já o PSD, lamentou não ter conseguido o referendo à revisão. E o PCP quis suspender os trabalhos.

As diferenças político-ideológicas entre os partidos com assento parlamentar marcaram ontem o arranque da discussão e votação em plenário da revisão constitucional. E se o conteúdo do texto constitucional parece hoje mais consensual entre todos, o facto é que as fronteiras entre esquerda e direita mantém-se na ordem do dia, com o PP a demarcar-se, por exemplo, do preâmbulo e a propôr, sem êxito, a sua eliminação, pois pertence à história - glorifica o 25 de Abril e propõe "abrir caminho para uma sociedade socialista".

Curiosamente, a história foi também agarrada pelo PSD. Em jeito de abertura, o constituinte e ex-presidente da AR Barbosa de Melo lamentou que o PSD não tenha conseguido fazer passar, nesta revisão, o referendo à mesma. Uma ideia que foi rebatida por Luís Sá, do PCP, e da qual, José Magalhães, do PS, tratou de se demarcar.

Mas se o PSD não conseguiu o referendo à Constituição revista, Barbosa de Melo não deixou de sublinhar a inclusão na Constituição de velhas e de novas bandeiras sociais-democratas. E com o presidente do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, na galeria dos convidados, Barbosa de Melo lembrou o voto dos emigrantes para a eleição do Presidente da República, a flexibilização do sistema eleitoral, a redução do número de deputados e o referendo à regionalização.

O ex-presidente da AR não deixou de elogiar o acordo do PSD e do PS para a revisão. Apelou mesmo aos socialistas descontentes com o resultado para que pensem como vão agir na votação, já que: "de uma divergência de opinião pessoal até à ruptura de um compromisso legitimamente assumido pelo grupo político a que se pertença vai necessariamente um grande passo."

Pelo PS, José Magalhães tratou também de glorificar os méritos do acordo e de salientar a prestação dos socialistas na Comissão Eventual de Revisão Constitucional. Jurou ao plenário que as alterações ao sistema eleitoral em nada alteram a proporcionalidade. E garantiu que as alterações introduzidas permitem referendar as questões europeias, bem como que esta revisão não põe em causa os calendários prometido pelo PS para a regionalização.

Quem fez questão de sublinhar que o acordo do PS e do PSD apenas teve como fim servir "a direita" foi o PCP. Luís Sá garantiu mesmo que "muitas das reivindicações da direita portuguesa foram consagradas na revisão, que muitas vezes foi além do acordo".

O dirigente e deputado PCP jurou que os comunistas votarão, por isso, "contra as maiorias de secretaria" arranjadas nas negociações paralelas entre o PS e o PSD, no que toca a direitos dos trabalhadores, economia, regionalização, referendo, etc.

Como prova de que o PCP não está disposto a facilitar a vida ao PS e ao PSD, João Amaral logo no arranque da sessão, protestou com o facto de o relatório final da comissão só ter sido distribuído ao meio dia e pediu, ali mesmo, a suspensão dos trabalhos para que os deputados o analisassem. Uma pretensão que não vingou.

E a discussão artigo a artigo iniciou-se, atacando os direitos fundamentais, sem propostas de alteração de relevo ou polémicas. A não ser no artigo 13º que fala do "princípio da igualdade". É existe uma proposta de "os Verdes" para introduzir o direito à não discriminação pela "opção sexual". Ou seja, o reconhecimento constitucional da homossexualidade.

A proposta não conseguiu na Comissão Eventual de Revisão Constitucional obter os dois terços necessários à sua passagem em plenário - PSD e PP abstiveram, PS, PCP e PEV votaram a favor -, mas a questão mantém-se em cima da mesa, já que a recente discussão sobre o alargamento dos direitos das uniões de facto trouxe à ribalta política a reflexão sobre o reconhecimento de direitos aos homossexuais.