Ela é fornecida nada mais nada menos que pelo comissário de polícia de Lourenço Marques. Eu peço licença a V. Exa. e à Câmara para ler um trechozinho dessa informação, que diz assim:
Leu.
Quere dizer: o comissário de polícia sabe por experiência própria que se formou uma companhia destinada a adquirir terrenos que serão cedidos a alemães, que neles dominam inteiramente, tendo os portugueses apenas o domínio do "pau de bandeira" e a residência da autoridade.
Para êsses terrenos, diz o comissário, vão apenas militares de alta graduação, e quando o Govêrno português não concede essa licença, conseguem-na êles por um cônsul que lha dá, instalando-se assim no terreno português.
Êste assunto há-de ser versado mais detalhadamente; no emtanto é conveniente chamar, desde já, para êle a atenção do Govêrno.
O Sr. Cunha Leal quis tratar em negócio urgente da situação do Alto Comissário em Moçambique.
Dei-lhe o meu voto. Hei-de querer intervir na discussão que se fizer.
Entendo que temos de olhar muito a sério para o que se passa naquela possessão portuguesa.
Ainda há dias, no Parlamento inglês, se pronunciaram a respeito de Portugal palavras sibilinas, que bem merecem ser ponderadas pelo Govêrno português afim de serem devidamente explicadas. A situação de Portugal perante a Inglaterra é de aliado e não de submissão. A Inglaterra tem de cumprir os seus tratados e estou certo que os cumprirá honrosamente.
Feitas estas ligeiras advertências, que como português quis fazer, vou entrar propriamente na matéria da minha interpelação.
Sr. Presidente: quer no Parlamento passado, quer neste mais de uma vez me tenho ocupado da situação dos homens deportados sem julgamento.
Fora desta sessão legislativa, no período eleitoral, por toda a parte onde me apresentei a fazer a propaganda do partido que represento, sempre, sem hesitação, olhando os que me ouviam, com inteira lealdade disse o que pensava sôbre essa matéria, Protestei sempre contra as deportações sem julgamento. Julguei-as como um acto arbitrário, violento e ilegal.
Sei que esta atitude que tomei e que tomaram os homens que estão na Esquerda Democrática nos valeu muita amargura.
Foi em volta desta atitude que se formou o ambiente de hostilidade com que lutámos durante o último período eleitoral.
Foi em volta da palavra bolchevista com que nos atiraram às pernas que se fez toda a propaganda contra o partido que tenho a honra de representar.
Agora, serenados os ânimos, já se não diz isso. Compreende-se que o que queremos é que a lei seja igual para todos.
Ninguém pode ser condenado sem julgamento. A deportação é uma pena que só os tribunais competentes e depois do julgamento podem aplicar.
Ter a coragem de dizer que esta doutrina se aplica a pequenos e grandes, a inocentes e criminosos, que esta doutrina se aplica ao mais pequeno e ao mais repugnante criminoso, ter a coragem de afirmar que saltar por cima desta disposição legal não é saltar por cima dos direitos individuais, não é atentar contra as liberdades públicas, é, na verdade uma grande audácia.
Sr. Presidente: habituados como estamos a não olhar aos perigos que corremos quando se trata de cumprir aquilo que supomos ser o cumprimento do nosso dever, não compreendemos bem, naquele momento, quantas amarguras nos poderia custar tal atitude, e foi talvez por isso que durante meses nos vimos em meio da sociedade portuguesa sustentando esta doutrina sob um chuveiro de impropérios.
Passado tempo, apareceu um protesto da Liga da Defesa do Homem, protesto simples, protesto tímido. Mais tarde, porém, bem mais tarde, já passadas as eleições, apareceu um protesto mais eloquente, protesto firmado e assinado por todos os homens de letras, os mais cultos do nosso tempo.
Sr. Presidente: foi com prazer que li essa representação subscrita pelos mais altos valores morais e mentais da nossa terra. Nunca me preocupou o apodo de bolchevista com que me quiseram marcar, sei bem que não sou bolchevista e