A oposição pode vir a unir-se contra a proposta de lei das finanças locais. O Executivo nem sequer pondera um chumbo
RETALIAÇÃO. Se o PS não é flexível na revisão, porque há-de ser o PCP flexível?, questiona Octávio Teixeira
A proposta de lei sobre finanças locais que o Governo hoje submete à discussão do Parlamento corre o risco de ser chumbada em São Bento. A última ameaça vem de onde menos se esperava: do PP. "Se o Governo fizer novamente o discurso da vitimização, o que constitui uma chantagem implícita ao Parlamento, votaremos contra o diploma. Porque não toleramos chantagens. Se, pelo contrário, o Governo vier mais disposto a dialogar do que a ameaçar, aceitaremos reponderar a nossa posição", disse ontem ao DN o deputado "popular" Gonçalo Ribeiro da Costa, que será o principal interveniente do PP.
O DN apurou que o Governo, embora esteja determinado a defender as suas propostas de lei, não reeditará a pseudocrise política por causa das finanças locais.
Também o PCP ameaça votar contra a proposta. Os comunistas, que admitiam abster-se, mudaram de posição em "retaliação" contra o calendário de actividades que o grupo parlamentar socialista insiste em apresentar nesta ponta final da sessão legislativa.
"O PS não mostra qualquer flexibilidade nesta matéria. Por que motivo haveremos nós de ser flexíveis?", interroga-se Octávio Teixeira, líder parlamentar do PCP, admitindo, deste modo, acompanhar PSD e PP na reprovação do diploma.
Além disso, na opinião de Luís Sá, os deputados vão travar um debate num "tempo errado e com conteúdo errado", já que as propostas de lei do Governo sobre a matéria deveriam ter sido discutidas em São Bento ao mesmo tempo que os projectos de lei da oposição entretanto remetidos para a comissão especializada.
O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, por sua vez, considera "absurda" a posição de "condicionamento" do voto do PCP à revisão constitucional. "O calendário das actividades parlamentares, e designadamente da discussão da revisão constitucional, depende em exclusivo da Assembleia da República. Não faz qualquer sentido relacionar o voto de uma proposta de lei com uma posição do Governo nesta matéria", disse Costa ao DN.
A definição do calendário parlamentar, reitera o secretário de Estado, é "uma questão estritamente interna da AR". De resto, o Governo "está constitucionalmente impedido de interferir no calendário da revisão".
Outro diploma que o Executivo apresenta hoje no Parlamento é a proposta de lei sobre transferência de competências para as autarquias locais. Um texto que já tem "passagem" assegurada no hemiciclo. Isto porque os sociais-democratas estão dispostos a viabilizá-la com um voto de abstenção. Quanto à proposta de lei de finanças locais, as "divergências profundas" sobre os montantes a transferir para as autarquias locais levam a bancada "laranja" à sua rejeição. Tanto mais que no projecto de lei do PSD se prevê uma dotação para os municípios muito superior, na ordem dos 150 milhões de contos.
É precisamente este montante que os socialistas vão tentar demonstrar que é inviável, a não ser, dirá o líder da bancada "rosa", que se aumente o "défice público" ou se aumentem os impostos. Assis deverá fazer, contudo, um discurso pela positiva, deixando perceber que o PS, se vir a sua proposta de lei de finanças locais aprovada, estará aberto ao diálogo na Comissão de Poder Local para que se encontre um "texto final ponderado e de consenso".
Ontem, o vice-presidente da bancada socialista José Junqueiro disse, ao DN, que o Governo "não abdicará dos pressupostos essenciais de uma proposta que considera estruturante para o sistema financiador das autarquias locais". O deputado excluía liminarmente a possibilidade de a proposta vir a ser "chumbada", tal como a da transferência de competências para as autarquias.