Morais Fonseca

Pelo menos 15 deputados do PS prometem votar contra, ou abster-se, na votação dos diplomas da JS e do PCP sobre despenalização do aborto. Com a aproximação do dia do debate parlamentar, cresce a convicção de que a aprovação destes dois projectos de lei depende de hipotéticos «furos» na bancada do PSD.

Dirigentes da bancada do PS como José Junqueiro e António Braga, médicos conhecidos como Eurico Figueiredo, João Rui de Almeida e Strecht Monteiro, além dos três deputados humanistas cristão (Maria do Rosário Carneiro, Jorge Góis e Claudio Monteiro), são alguns dos nomes certos do Grupo Parlamantar «rosa» que não viabilizarão os projectos de lei da Juventude Socialista e do PCP sobre interrupção voluntária da gravidez. A esta lista de nomes contra a liberalização do aborto, quando praticado nas 12 primeiras de gestação, podem acrescentar-se ainda outros deputados como José Saraiva, Júlio Faria e Carlos Zorrinho, e mais alguns, como António Mart inho, que ainda não definiram o seu sentido de voto, mas que dificilmente viabilizarão as iniciativas de liberalização do aborto.

Por outro lado, de acordo com as primeiras estimativas em torno da bancada «rosa», com a aproximação do dia do debate parlamentar, a 20 de Fevereiro, a tendência é para que cada vez mais deputados optem por seguir a posição de António Guterres. Em diversas circunstâncias, o primeiro-ministro já se manifestou contra os diplomas da JS e do PCP, admitindo, contudo, o alargamento dos prazos para o aborto eugénico (ou por mal formação do feto), de 16 para 24 semanas. O diploma de Strecht Monteiro, que apenas alarga os prazos para o aborto eugénico, deverá ser o único a passar na Assembleia da República. Além de recolher quase a unanimidade entre os partidos da esquerda, também no PSD goza de relativa simpatia. Paulo Mendo, ex-ministro da Saúde, defende o projecto de lei do socialista Strecht Monteiro, mas assegurou ontem ao JN que votará contra os diplomas da JS e do PCP «por razões políticas».

Assim, se vier a ser rejeitada a liberalização do aborto, também ficará sem efeito o referendo sobre este tema. Ontem, durante o debate parlamentar, Jorge Lacão, uma vez mais, fez depender a realização da consulta aos portugueses da aprovação das propostas do PCP e do PS.

Mas a ideia de o PS se abrir ao referendo não foi nada pacífica na reunião da bancada, no período da manhã. Jorge Strecht mostrou-se insatisfeito com a atitude assumida pela Direcção de Jorge Lacão, que, na véspera, em conferência de imprensa, anunciara a firme disposição do PS se bater pelo referendo ao aborto, no caso de os diplomas «liberalizadores» passarem no próximo dia 20. Ao tomar esta posição, segundo Strecht Ribeiro, a Direcção da bancada condicionou o debate de ontem, de manhã, envolvendo todos os deputados.

Também a JS se revelou descontente com a posição da Direcção «rosa». Ricardo Castanheira deixou bem claro que a JS continuará a ser contra o referendo. E que se a consulta se realizar, fará campanha pelo «sim» ao aborto livre, durante as 12 primeiras semanas de gravidez. Já Afonso Candal disse não compreender a necessidade de se realizar um referendo, depois de o Parlamento, órgão soberano, se pronunciar a favor das propostas de lei da JS e do PCP.

Horas, mais tarde, no debate parlamentar, da tarde, Jorge Lacão revelou que o PS estava aberto à ideia de proceder à votação nominal das lei dos aborto. Esta posição, na sequência de uma pergunta formulada por Manuel Monteiro, é encarada como mais um obstáculo à livre opção de vários deputados do PSD, que prefeririam o voto secreto. Ou seja, desta forma, por votação nominal, muitos terão dificuldade em contrariar a posição de Marcelo, como se sabe, anti-aborto livre. Entre os 88 deputados «laranja», apenas se admite que Pedro Pinto vote ao lado da JS e do PCP. Mesmo assim, nem esse voto social-democrata se encontra garantido. Assegurada, isso sim, está a ideia de que o PSD não abandonará o hemiciclo no momento em que forem votados os diplomas sobre o aborto.