O cinema americano mudou-se para a Europa.
Para as salas europeias, já se havia mudado há muito tempo - a fatia de mercado dos filmes dos EUA nos países da UE não pára de crescer.
Mas agora Hollywood parece estar também a mudar-se para os estúdios europeus, como revela um estudo da revista Variety.
É cada vez maior o número de grandes produções americanas que são filmadas na Europa, em estúdios que têm nomes tão célebres como Babelsberg (Alemanha), Boulogne (França), Cinecittà (Itália), Shepperton e Pinewood (Reino Unido).
Nos Boulogne Studios, por exemplo, Roman Polanski começará brevemente a rodagem de The Double, uma superprodução com John Travolta e Isabelle Adjani.
Mas o estúdio francês é dos que ainda precisam de reactualizar o equipamento para poderem atrair o tipo de investimento de que, no mundo do cinema, só Hollywood é capaz.
É isso mesmo, aliás, o que irá acontecer no próximo ano com o seu encerramento temporário, para reequipamento, o que lhe permitirá finalmente competir com os potentados que são os estúdios britânicos.
Nos últimos três anos, o Reino Unido tornou-se uma espécie de centro de produção de Hollywood na Europa, e os demais estúdios europeus, olhando para os números (por cada produção de 60 milhões de dólares, cerca de nove milhões de contos, que Pinewood ou Shepperton acolhem, é um milhão e meio de contos que entra directamente na economia britânica), tencionam candidatar-se a uma parte do bolo.
Daí o esforço de reestruturação e reconversão que muitos deles fazem neste momento.
Nos últimos meses, Sylvester Stallone esteve a filmar na Itália, Mel Gibson na Irlanda, Bruce Willis, Tom Cruise e Madonna em Inglaterra e John Travolta prepara-se para fazer o mesmo em França.
Aquilo a que em Hollywood se chama a «A-List», a «Lista A» - as vedetas mais importantes e rentáveis -, tem passado grande parte do seu tempo na Europa.
Em Pinewood, foram filmados nos anos mais recentes Entrevista com o Vampiro (Tom Cruise), O Primeiro Cavaleiro (Richard Gere), Missão Impossível (Cruise), O Santo (Val Kilmer) e The Fifth Element (Willis).
Em Shepperton, foram rodados Judge Dredd (Stallone), a remake em imagem real de Os 101 Dálmatas (Glenn Close) e Evita (Madonna).
Em Leavesden, outro estúdio inglês, foi produzido GoldenEye, o último James Bond.
Em Ardmore, um estúdio irlandês, rodou-se Braveheart - O Desafio do Guerreiro, o filme de e com Mel Gibson que viria a impor-se nos Óscares-96.
Nos estúdios Barrandov, situados na República Checa, filmaram-se as remakes em imagem real de Pinocchio (com Martin Landau) e Branca de Neve (com Sigourney Weaver).
Na Cinecittà, o filme mais conhecido ali rodado nos últimos anos foi Cliffhanger, com Sylvester Stallone.
Em Portugal, dá-se com os europeus aquilo que, no resto da Europa, acontece com os americanos.
Isto é, em Portugal, pelas tradicionais razões de termos mão-de-obra barata, bom tempo, cenários variados e técnicos de boa qualidade, é frequente acolhermos produções estrangeiras, sobretudo europeias, em que está envolvido, com uma participação minoritária, um produtor português, que habitualmente não tem qualquer palavra a dizer na parte criativa do filme e se limita a fornecer serviços.
Aqui, como no resto da Europa, a motivação para receber produções estrangeiras, sejam elas europeias, americanas ou um misto das duas, é estritamente financeira.
À tradicional acusação de que o país que acolhe passivamente produções estrangeiras está a «vender» a sua paisagem e os seus serviços, sem ter, em troca, qualquer participação identificável no produto final, as indústrias locais respondem que aquele é dinheiro que entra nas cinematografias locais e que poderá ajudá-las.
Por exemplo, é bom para um país produtor possuir estúdios apetrechados com o equipamento mais moderno.
Como o é os profissionais locais verem como funcionam as grandes máquinas cinematográficas americanas.
Claro que os estúdios europeus não dependem só do cinema americano.
Na maior parte, estão equipados também para «hospedarem» produções televisivas, neste caso, sejam co-produções euro-americanas (minisséries, telefilmes), sejam produções europeias.
A indústria do cinema europeu e muitos responsáveis políticos têm uma forte retórica antiamericana.
Mas a cooperação que se verifica no terreno inviabiliza qualquer acção proteccionista mais concreta.