as Ondas

definitivamente teatro

%Lucinda Canelas

Primeiro Clara Andermatt teve de escolher as pessoas que queria ter a seu lado em "As Ondas", a peça que hoje estreia no Auditório Eunice Muñoz, em Oeiras. Não sabia ainda que texto iria trabalhar, mas tinha a certeza que chegara o momento de se entregar a um projecto antigo, sempre adiado - o teatro.

O encontro com o actor e encenador João Garcia Miguel deu-se por acaso no Colina, em Montemor-o-Novo, e tornou evidente o desejo de estabelecer uma colaboração mais duradoura. Michael Margotta, dramaturgo e professor de teatro em Nova Iorque e no Actor's Center de Roma, veio mais tarde, através de uma série de três "worshops" em que Andermatt se deixou fascinar pelo seu método de trabalho.

"O Michael é mestre na forma de ler e dar a ler um texto", diz a bailarina e coreógrafa que se habituou a explorar a palavra a partir de fragmentos de escrita e que sempre teve um universo teatral por trás do movimento. "Com ele descobri o ritmo do texto, a sua poeticidade. Aprendi a dissecar a obra, a seguir o processo de construção das personagens, a olhar para as linhas paralelas da acção."

"As Ondas", com base no romance homónimo de Virginia Woolf - que a escritora Marguerite Yourcenar define como "uma meditação sobre a vida", "um ensaio sobre a solidão" - marca a estreia "ambiciosa" de Andermatt em duas esferas: a do teatro, a partir de uma obra "integral e estruturada", e a da co-criação.

Depois de ultrapassada a barreira da escolha do texto - foi Garcia Miguel quem convenceu Andermatt que "As Ondas" seria o ideal depois de lhe ter oferecido "Orlando", da mesma autora - os dois intérpretes começaram a conceber o projecto. Mais tarde, convidaram Margotta a participar e entregaram-se nas suas mãos experientes (tem um percurso de 38 anos como encenador, actor e professor, tendo-se especializado na análise de texto).

"Andámos um mês só à volta da obra, a ler e a reler. A violar o texto, a fazer perguntas." As dezenas de anotações coladas na parede do estúdio de dança e os exemplares da obra abandonadas sobre a mesa (encontrámo-las um mês antes desta conversa com Andermatt) confirmam este trabalho de laboratório.

"Antes de conhecer Michael Margotta fazia tudo intuitivamente. Hoje sinto que ele me ensinou a crescer dentro do texto. Eu entro na escrita consciente da forma como estou a entrar", reconhece a coreógrafa que nesta primeira aventura teatral dá corpo a três personagens (Rhoda, Jinny e Susan). João Garcia Miguel interpreta as figuras masculinas de Woolf (Louis, Neville e Bernard).

Entre os dois (ou melhor, os seis) cresce uma cumplicidade à medida que a acção se desenvolve de forma linear. "Se a peça fosse só minha seria totalmente diferente, muito mais física. Se fosse só do João também, mas mais conceptual. O que temos aqui é um compromisso que resulta do exercício de humildade que a co-criação exige e que está muito ligado à direcção do Michael Margotta."

Para Andermatt, aquela que é uma das mais importantes obras de Woolf narra a passagem pela vida de seis pessoas que vemos crescer e envelhecer, enfrentando a descoberta de coisas belas ou brutais num processo de formação da identidade. "É um livro difícil, com uma complexidade narrativa tremenda a exigir sempre muita atenção. Mas é fascinante. Tem ao mesmo tempo uma grande turbulência e uma grande paz." Como o mar.

Apesar de o cartaz junto à entrada do Auditório Eunice Muñoz dizer que "As Ondas" é um espectáculo de dança - está lá a fisicalidade de Andermatt, mas fora da moldura habitual - a coreógrafa adverte: "Apetecia-me experimentar coisas novas, deixar-me levar. E foi isso que fiz. Isto é definitivamente teatro."

Um projecto de Clara Andermatt, João Garcia Miguel e Michael Margotta. Com Clara Andermatt e João Garcia Miguel. Composição musical de João Lucas. Vídeo de João Dias.

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