28 Diário da Câmara dos Deputados
Estou certo que o Sr. Agatão Lança quando reflectir sôbre o que se passou aqui, não há-de achar bem que o Sr. Presidente do Ministério viesse trazer para êste debate um papelinho com cousas escritas para me atirar à cabeça. O homem que tam valentemente se bateu no Rato, não pode achar isso bem.
Também só a paixão política o pode ter levado a, num momento de divergir da opinião do Sr. Amâncio de Alpoim, procurar apresentar êste meu ilustre correligionário como monárquico.
O homem que se zangou comigo por causa da ironia. ..
O Sr. Agatão Lança (interrompendo): - Eu não me zanguei. Apenas desprezei as obscenidades que V. Exa. classifica de ironias. Mas isso não é para aqui, porque o caso não interessa à Câmara.
O Orador: - A Câmara deve ter sempre interêsse em saber a verdade das cousas.
Repito: o Sr. Agatão Lança quando reflectir há-de ser o primeiro a reconhecer que foi injusto com o Sr. Alpoim.
Quanto ao que foi dito pelo Sr. Presidente do Ministério, devo declarar que não tem isso para mim a menor importância. O mais que pode causar-me é tristeza, profunda piedade, pela inferioridade da arma que lhe meteram nas mãos, pelo que contém de feio, de deselegante um semelhante processo de defesa.
Mantenho as melhores relações com o Sr. Ferreira do Amaral. É exacta a conversa a que se referiu o Sr. Presidente do Ministério, havida entre mim e aquele senhor.
Toda a Câmara conhece a minha maneira de ver. O próprio Sr. Ferreira do Amaral pode depor acerca da natureza das nossas relações, para justificar que eu, que sempre que o encontro o convido para comandante das guardas vermelhas, lhe pudesse ter dito: está bem! quando queiramos fazer alguma conferência, você proíbe-a e a gente não a faz.
Ao bom senso e critério de toda a gente eu recomendo o processo, porque êle é realmente bom...
Tudo isto o que me faz é uma tristeza de tal ordem, que nem V. Exas. imaginam, porque vejo a forma como em Portugal
se está fazendo o combate político, num desvairamento que só é próprio de pessoas que não tem miolos na cabeça.
O Sr. Amaral Reis (interrompendo): - Eu creio que, de algum tempo a esta parte, algumas pessoas não trazem a cabeça no seu lugar, certamente devido às águas andarem inquinadas... O que aqui se está passando é uma vergonha para todos nós...
Eu pregunto: de que é que se estava tratando? ^São os trabalhadores, são os socialistas que estão deportados?
O Orador: -Vamos a falar com serenidade, vamos então a dizer a V. Exa. a razão da atitude que nós, socialistas, tomámos.
Se eu assistisse à iminência de um alentado à bomba ou a tiro, fôsse contra quem fôsse, e, se eu tivesse na algibeira uma pistola que me permitisse ali mesmo, acto contínuo, antes que o atentado se cometesse, estender com um tiro o homem que tentava contra a vida de outrem, eu fazia-o.
Entre os homens da chamada Legião Vermelha, se há inocentes, há outros que, explorando com um ideal de redenção e de grandeza são, na verdade, criminosos de direito comum.
Eu nunca neguei à sociedade o direito de se defender, e a minha conversa foi no momento em que eu estava indignado com o procedimento de alguns homens que, não pertencendo a nenhum partido, espalhavam o terror. O que eu disse é que a sociedade portuguesa precisava de ser expurgada dêsses elementos, que bastante comprometiam os trabalhadores.
Julgam V. Exas. que eu, amanhã, não condenaria, num júri um homem contra quem se provasse qualquer dos crimes a que o Sr. Presidente do Ministério se referiu?
O que nós pretendemos é que êsses homens sejam julgados pelos tribunais competentes, mas aqui, e que se absolvam os inocentes e condenem os que, realmente, se provar que são criminosos.
Não queiram confundir a nossa atitude, Srs. republicanos da direita, porque isso é uma miserável especulação política, bastante condenável.