Algarve "Há Gente a Passar Fome, Dormindo nas Obras Ou na Praia"

O aproximar do Verão conduz até ao Algarve muita gente que, no sector turístico, tenta uma oportunidade de trabalho. Porém, muitas das vezes as expectativas saem frustradas e há pessoas a roubar para comer. À porta da Misericórdia de Albufeira, uma cidade conhecida pela riqueza do turismo, quase todos os dias chegam homens e mulheres a pedir comida. Situação idêntica verifica-se noutras instituições de solidariedade social da região. "É a fome envergonhada", diz o provedor da Misericórdia de Faro, Candeias Neto.

A provedora da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira, Helena Serra, afirma que os carenciados não são apenas pessoas do Algarve: "Desempregados de outras regiões procuram aqui encontrar trabalho, mas nem sempre conseguem"... No Verão não faltam ofertas de trabalho, mas na época baixa do turismo o desemprego atinge todas as profissões. O assalto a supermercados e o roubo de roupas em apartamentos de Albufeira é sintoma do estado da situação.

Na turística cidade de Albufeira não faltam bares e discotecas e muitos apartamentos turísticos - desocupados na maior parte dos meses do ano. Mas, na outra face da medalha, afirma Helena Serra, "há gente a passar fome, dormindo nas obras ou na praia".

Os fluxos migratórios de trabalhadores do Leste, sublinha, vieram agravar a situação. "A Santa Casa da Misericórdia de Albufeira alimenta imigrantes ilegais, com conhecimento das autoridades. Não podem trabalhar porque não estão legalizados e não se podem legalizar porque não têm trabalho".

Em Olhão, as dificuldades das famílias não estão directamente relacionadas com a sazonalidade turística, mas sim com o sector da pesca. A indústria conserveira entrou em crise, o desemprego aumentou e as famílias ficaram sem trabalho.

De alguma forma, a venda do marisco, apanhado na Ria Formosa, faz com que as dificuldades não sejam tão notoriamente acentuadas. Mesmo assim, no "Celeiro do Amor", uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS), são oferecidos diariamente entre 60 a 70 almoços a residentes no concelho. Para jantar os utentes geralmente levam uma sopa e uma sanduíche. Ali batem à porta pessoas com percursos de vida muito diferentes, em busca de uma refeição quente, desde os toxicopedentes aos desempregados.

Esta IPSS, com cerca de duas dezenas de anos, nasceu da boa vontade de uma mulher que pintava jarras e fazia rifas para arranjar o dinheiro necessário para comprar géneros alimentícios e oferecer aos mais necessitados. A determinada altura, constatou que as pessoas vendiam as coisas que lhes eram oferecidas. A partir daí, arranjou um local onde, com ajuda de voluntários, passou a fornecer refeições para dar de comer a quem tinha fome.

Em Faro, o provedor Santa Casa da Misericórdia denuncia: "A sociedade não faz ideia da forma envergonhada que existe na cidade". Além das refeições ao domicílio, a instituição oferece alimentos para levar para casa a dez famílias.

No entender do provedor, foram o desemprego e os problemas relacionados com a toxicopedência que fizeram disparar o número de pessoas que estão a passar por dificuldades. No ano passado, " foram oferecidas, em média, mais de duas mil refeições por mês". No entanto, por falta de verbas este número foi actualmente reduzido para menos de metade.

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