evidência com que se apresentam, as razões por que hoje persisto no meu protesto.

Escuso de recordar a natureza dos crimes praticados; escuso de lembrar que a violência brutal com que foram realizados revoltou justamente todas as pessoas bem formadas desta terra.

Das fileiras operárias, dos próprios militantes do sindicalismo, do comunismo, surgiram, desde a primeira hora, protestos violentos, sinceros, contra essa forma de luta que redunda em descrédito das confissões políticas e sociais a cujo serviço pretendem colocar-se.

Nenhum de nós, os que continuamos a protestar contra a forma usada, deseja ter a mínima espécie de solidariedade com os crimes praticados, com os processos empregados. (Apoiados). Nenhuma das nossas palavras pode ser tomada como incitamento, directo ou indirecto, a uma forma de acção que, repito, repugna a todos os corações bem formados, por ser a prática da anulação arbitrária da vida humana, por ser a prática da pena de morte, aplicada sem julgamento, por associações secretas de pessoas agremiadas, mais pelo exagero da paixão, do que propriamente pelo sentimento idiológico de transformar uma sociedade.

Protestamos precisamente, porque não queremos que o Estado ocupe a mesma função daqueles que pretende castigar; protestamos em nome dos princípios que fundamentam a própria civilização; protestamos, porque a violação do Direito vem, desde a vindicta dos primitivos, à igualdade legal do nosso tempo. Protestamos porque, segundo a elevada definição de um legista, a pena é, essencialmente, uma acção passional de sinceridade graduada que a sociedade exerce, por intermédio do um corpo constituído, para com aqueles dos seus membros que violaram certas regras de conduta.

Êste princípio da igualdade legal é o fundamento do meu protesto.

Há a considerar que em Portugal se deu uma série de atentados de carácter pessoal, realizados com violência inaudita.

Rematou essa série um atentado realizando contra o próprio comandante do Corpo de Segurança Pública de Lisboa.

Criou-se um ambiente de terror e de repulsa; e em muitas pessoas chegou a surgir a idea de responder à violência com a violência.

Mas, Sr. Presidente, se essa psicologia atingiu o espírito de todos aqueles cujo coração pulsava de revolta pelos processos empregados, ela não podia transmitir-se aos homens do Govêrno, que têm a obrigação de defender um corpo de princípios, de doutrinas, que custaram alguns séculos de luta, correndo imenso sangue.

Não defendo, Sr. Presidente, repito, os crimes que se praticaram. E assim, devo dizer a V. Exa. e à Câmara que, falando a êste respeito, não pretendo por qualquer forma defendê-los. Antes pelo contrario; pois, o meu desejo, é que acabem de uma vez para sempre as paixões que lavram entre nós, de forma a que possamos ser tidos como uma sociedade organizada.

Devo dizer na verdade a V. Exas. que as razões determinantes do meu protesto são essencialmente de ordem social.

A verdade é que para mim os atentados que só realizaram em Lisboa devem ser tomados como um sintonia, e não como uma causa. E aqueles que julgam que pela violência podem de qualquer maneira evitar a continuação de casos dessa natureza, enganam-se pura e simplesmente.

Os crimes, Sr. Presidente, praticados pela Legião Vermelha são na verdade o produto dos desregramentos da sociedade, para os quais contribui essencialmente a falta de instrução do nosso povo.

Esta é que é a verdade. E, se V. Exas. se quiserem dar ao trabalho de fazer o que eu tenho feito por mais de uma vez, isto é, percorrerem as várias ruas dos nossos bairros pobres, onde a maioria das casas não têm ar, nem luz e onde as crianças fazem vida nas ruas, obtendo assim uma educação de perversidade e malvadez, hão-de chegar à conclusão de que eu tenho absoluta razão dizendo o que digo.

O que se torna, portanto, absolutamente necessário, a meu ver, é fazer com que a sociedade seja organizada pôr uma forma diversa daquela em que se encontra, evitando que as crianças tenham essa educação