O PP só sobrevive afastado do PSD

Victor Sá Machado recorda o ex-CDS. E defende a existência de um partido da direita democrática

Victor Sá Machado marcou a história do CDS. Assumiu-se desde sempre como homem de esquerda, mesmo quando essa designação era em 1974/75 uma dissonância profunda com o partido que ajudou a construir. Abandonou o partido quando o CDS acabou abrindo caminho ao PP.

Administrador da Fundação Gulbenkian, reduziu a sua intervenção política ao movimento Humanismo e Democracia, que assinou um protocolo político com a Nova Maioria "rosa". Com um olhar distanciado, Sá Machado recorda o antigo CDS e comenta o futuro do PP.

"O partido surge não pelo que era, mas pelo que não era: não era marxista nem socialista. Uma baliza fundamental quando existiam 14 partidos marxistas em Portugal e mesmo o PPD não rejeitava uma leitura marxista. É com este propósito que um grupo de pessoas oriundos do centro-esquerda, do centro-direita, ou da direita mais conservadora, com percursos diferentes, criaram o CDS. A virtude desse pequeno partido foi ter obrigado a revolução, num período muito conturbado, a abrir-se. Muitas vezes sem contar com a solidariedade dos outros partidos." Reconhece que inicialmente havia o convencimento de que o CDS seria o maior partido político português. "Pensávamos que a maioria do povo português era de direita. Uma direita democrática. Não contámos com as consequências do processo revolucionário. A maioria dos portugueses tinham medo da revolução e rapidamente perceberam que seriam melhor protegidos juntando-se aos dois partidos - PS e PSD - que tinham um diálogo mais fácil com a revolução. As diferenças entre nós, a lógica dos medos, a normalização da vida política contribuíram para que o CDS ficasse um pequeno partido." Ironia da história, segundo Sá Machado: "Quando os objectivos do CDS triunfam - fazer de Portugal uma democracia europeia - o partido perde influência." É reconhecida a qualidade da argumentação teórica dos pais do CDS, onde tinha um papel fundamental Adelino Amaro da Costa, mas "o PSD acaba por protagonizar melhor as nossas ideias".

As relações difíceis do CDS com o seu parceiro natural, o PSD, marcaram os avanços e recuos do partido. "Embora inicialmente se assumisse como partido de esquerda, o PPD-PSD sempre foi de centro-direita", e esta sobreposição ideológica terá determinado o fim do ex-CDS. Paralelamente, numa lógica da sobrevivência, o discurso radicalizou-se à direita, dando fôlego ao PP.

"O centro político é cada vez mais o espaço dos partidos socialistas e sociais-democratas. Governar é governar ao centro, é resolver aos problemas dos cidadãos, não é fazer utopia." Não prevê a extinção do PP, desde que se continue a assumir como partido de direita, afastado do PSD. "Sendo eu um europeísta, penso que poderá ser útil que a crítica à Europa e temas como a segurança, o aborto ou a soberania nacional sejam defendidos por um partido de direita democrático, que faz parte do sistema e apresenta as suas propostas no Parlamento. Seria perigoso que estas bandeiras caíssem nas mãos de uma direita antidemocrática, tipo Le Pen."

Viagem ao passado

JULHO 1974. É fundado o Centro Democrático Social (CDS). Entre os fundadores, Freitas do Amaral, Amaro da Costa, Basílio Horta.

ABRIL 1975. Eleições para a Constituinte. CDS tem 7,6 por cento, 16 deputados.

ABRIL 1976. Eleições para a Assembleia da República, CDS tem 16 por cento, e 41 deputados. Terceira força política.

JANEIRO 1978. Através de acordo com PS, CDS ganha três ministros no Governo presidido por Mário Soares. Demitem-se em Agosto, cai o Governo.

JULHO 1979. Constitui com PSD e PPM a Aliança Democrática.

SETEMBRO 1981. CDS participa com 16 elementos no VIII Governo Constitucional, o terceiro AD, segundo presidido por Pinto Balsemão. Freitas é vice-primeiro-ministro.

ABRIL 1986. Lucas Pires demite-se com a derrota do CDS nas legislativas e é convocado congresso extraordinário. Adriano Moreira é o novo líder. Renasce a direita no CDS.

MARÇO 1992. Freitas abandona a presidência. O X Congresso elege Monteiro, que "varre" os órgãos dos históricos.

MARÇO 1996. O congresso do "café". Monteiro ameaça sair. Portas surgiu, viu, e venceu, com discurso ovacionado.